quinta-feira, 24 de junho de 2010

Por que mudar o Código de Processo Civil?

Mudanças
O CPC em vigor foi sancionado em 1973 e, desde então, sofreu vários movimentos de reforma, sendo os mais recentes e profundos capitaneados pelos ministros Salvio de Figueiredo Teixeira e Athos Gusmão Carneiro. Com a minirreforma de 1994, cujo paradigma era a instrumentalidade do processo, sua atuação tempestiva e eficaz, foram introduzidos os institutos da tutela antecipada e tutela específica no ordenamento processual (arts.273 e 461 CPC).

Em 1995, introduziu-se o novo regime do agravo de instrumento. No ano de 1998, o artigo 557 foi introduzido para ampliar os poderes do relator que, monocraticamente, nega seguimento a recursos manifestamente improcedentes, prejudicados ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante.

O transcorrer de uma década provocou nova onda de reformas no CPC, culminando na nomeação da Comissão de Juristas, instituída pelo Ato 379 de 2009, do presidente do Senado Federal, encarregada de elaborar o anteprojeto do novo Código de Processo Civil.

Voltamos à indagação inicial: por que mudar o CPC? Acaso o Código em vigor não é eficaz? O novo CPC mudará o paradigma existente e acelerará o processamento das demandas? A resposta à questão nos parece ser: o problema da eficácia da tutela jurisdicional não é de lei em tese, é infraestrutural. A lei em tese não atinge sua concretude se o ambiente em que deve se aperfeiçoar não estiver compatibilizado às mudanças propostas. Reformar o CPC mais uma vez e não modernizar a infraestrutura jurisdicional parece-nos inútil.

Ações como uma reforma infraestrutural profunda são pressupostos da fluidez das reformas propostas pela nobre Comissão de Juristas. Não se pode pensar em celeridade ou rapidez antes da consolidação de condições razoáveis de trabalho nas estruturais judiciárias.

Refiro-me, em especial ao Tribunal de Justiça do estado de São Paulo, cuja quantidade de processos atinge mais de 16 milhões na 1ª instância, e que conta com um quadro de, aproximadamente, dois mil juízes no estado inteiro.

Ainda assim, a adoção de mecanismos para inibir a propositura de ações não se afigura a melhor solução, dentro do marco democrático do Estado de Direito. Por outro lado, a litigância de má-fé é um mecanismo presente no ordenamento processual e possibilita a punição daquele que se utilizar de forma indevida do processo.

É bem verdade que a introdução de mecanismos que contemplem a diminuição da litigiosidade, a exemplo do estímulo à conciliação, sempre são bem-vindas, mas não com a finalidade de obter a diminuição quantitativa de processos, senão para alcançar a mudança de mentalidade social.

De especial relevância é o tema da desburocratização cartorária, através da definição mais clara dos atos ordinatórios a serem praticados pelo escrivão e pela concessão aos advogados da faculdade de promover a intimação pelo correio do advogado da parte contrária, de testemunhas etc. Igualmente, no tocante à adequação ao processo eletrônico, compatibilizando a comunicação dos atos processuais com o novo sistema.

Porém, frise-se: as estruturas para o alcance desta adaptação ao processo eletrônico e as rotinas a serem apropriadas não são matéria de lei em tese, mas de infraestrutura, de condições espaciais e físicas reais, concretas, fenomênicas.

Como paradigma a confirmar essa assertiva, servimo-nos do exemplo histórico do TRT da 2ª. Região, que, até há duas décadas, era a fotografia do caos estrutural e hoje representa um modelo em gestão eletrônica de processos e adoção de normas técnicas de certificação de qualidade. O alcance da ação em tempo real depende de sua ocorrência em um espaço real.

Por tudo isso, é mais do que urgente, que a autonomia do Poder Judiciário seja efetivada, com a administração própria dos recursos oriundos do recolhimento da taxa judiciária, os quais hoje, no Estado de São Paulo, são destinados ao caixa único do Poder Executivo, além da otimização do Fundo Especial do Tribunal de Justiça, viabilizando a captação de recursos para investimentos e a participação do Judiciário na receita do spread dos depósitos judiciais, hoje apropriado pela instituição financeira que administra o volume de recursos o qual ultrapassa R$ 15 bilhões.

A equação tempo/espaço será bem-sucedida se ambas as variantes estiverem em sintonia. Para dotar a jurisdição de eficácia e celeridade em tempo real, imperioso que o espaço do Poder Judiciário, com suas estruturas físicas, de informática e pessoal, estejam aptas a dar tal tratamento ao processo e ao jurisdicionado, em condições de igualdade de acesso ao tempo e ao espaço.

Por Evane Beiguelman Kramer
Fonte: Direito & Justiça

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