terça-feira, 1 de junho de 2010

O novo CPC, uma lei popular

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Está prevista para o dia 8 de junho deste ano a entrega do anteprojeto do novo Código de Processo Civil ao Senado Federal, elaborado pela Comissão de Juristas, que irá acompanhar os trabalhos legislativos até a sua aprovação no Congresso Nacional. Exige a nova ordem jurídica assegurar a concretização dos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal, dentre eles o princípio da razoável duração do processo, aí incluída a atividade satisfativa, ou seja, a entrega plena do direito ao cidadão.

Nesse contexto, faltaria plenitude ao comando constitucional se o procedimento pelo qual se busca a efetiva tutela do Estado, no caso o processo civil, não se amoldasse aos anseios permeados pelo legislador, somando-se a outros princípios, como os da dignidade humana e eficiência da prestação do serviço público. Justiça tardia não é Justiça, já dizia Rui Barbosa. E não existe pior desordem do que a injustiça.

O Código atual, apesar de todas as reformas, não se mostraram suficientes, conquanto contaminadas pelas liturgias e fórmulas usuais ainda em vigor. Alie-se ao excessivo número de demandas. Tramitam por ano, no STJ, mais de 250 mil recursos. Hoje há possibilidade, acredite-se, de serem interpostos aproximadamente 40 recursos no processo de primeiro grau.

Como se exige, as mudanças propostas vem de encontro a essa disfunção, sem obviamente chamuscar o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa. As inovações, ao reverso, não são abruptas ao ponto de se quebrar todo um sistema já sedimentado, mas de aprimorá-lo dentro da necessidade e sensatez.

A unificação dos prazos, a redução dos recursos meramente protelatórios, a valorização da conciliação como ideal de pacificação social, o enxugamento dos procedimentos, a abolição do excesso de formalismo, o uso da informática como forma de celeridade e objetividade, nos levam à convicção de estarmos no caminho correto.

Não se pode mais aceitar que alguém tenha uma resposta judicial de uma forma e outra pessoa de outra, quando a questão julgada é exatamente a mesma para ambas. Se todas as pretensões são homogêneas, de massa, devem ter tratamento igual pela nossa Justiça, notadamente depois de amplamente debatidas.

Cito um exemplo para elucidação: um juiz de primeiro grau reconhece a ilegalidade de cobrança de um imposto baseado nas decisões pacíficas e consolidadas pela jurisprudência do STJ ou do STF, em inúmeros julgados acerca da mesma questão jurídica. Seu vizinho, em idêntica questão de direito, é condenado a pagar o mesmo imposto porque outro juiz monocrático entende que a cobrança é legal, diferentemente do pacificado pelos tribunais superiores.

Isso, sim, é desigualdade perante a Justiça. A estabilidade social e segurança jurídica são a pedra de toque do Poder Judiciário. O exemplo citado ocorre comumente hoje no dia a dia forense. Com as mudanças propostas, isso não mais ocorrerá.

Com efeito, a existência de instrumentos céleres e paritários, com a criação do incidente de resolução de ações repetitivas viabilizará também a rapidez, eficiência, segurança e estabilidade jurídica às partes. Várias ações que versem sobre idêntica questão de direito, que sejam capazes de gerar grave insegurança jurídica e multiplicação de processos, poderão ser resolvidas rapidamente.

Trago mais um exemplo: hoje, na maioria das varas judiciais, a grande parte das ações é de revisão de contrato bancário. Vamos supor que existam milhares de demandas levantando a ilegalidade de certa taxa cobrada pelos bancos. Pela proposta, resumidamente, o juiz, ou o desembargador, qualquer das partes, a Defensoria Pública ou o Ministério Público, suscita ao tribunal o incidente de resolução de ações repetitivas. Ou seja, pede-se que a Justiça de segundo grau decida, desde logo, se é ou não é ilegal a cobrança dessa taxa.

De pronto, aceito o incidente, suspendem-se todos os processos idênticos naquele estado, e o tribunal julga a questão jurídica, ficando seus órgãos vinculados a acolher o que foi decidido na decisão colegiada. Assim, aqueles processos suspensos no primeiro e segundo grau serão julgados um a um, todavia deverão obedecer ao comando da instância superior referente à questão de direito. Em outras palavras, se o tribunal decidir que é legal a cobrança da taxa, o juiz não poderá julgar dizendo que é ilegal.

Todos os interessados poderão participar do processo, inclusive recorrer da decisão do tribunal estadual ou regional federal ao STJ ou ao STF. Espera-se, com essas modificações, especialmente no que pertine ao incidente de resolução de ações repetitivas, reduzir em até 70% o tempo de tramitação de um processo.

Evidente, como se vê, que o novo Código põe fim a essa discrepância de diferenciação de tratamento jurídico às partes e postergação da efetivação do direito, e sem prejuízo da qualificação da resposta judicial, aliada a celeridade. Cabe salientar, entretanto, que o aparelhamento da Justiça de primeiro grau será medida imperativa para o objetivo traçado, diga-se de passagem, meta do colendo Conselho Nacional de Justiça, órgão que vem primando pelo estrito cumprimento da legalidade dos atos dos tribunais na seara administrativa, apresentando-se imprescindível, mormente pela razoabilidade e firmeza de suas decisões.

Destaque-se ainda a maciça participação popular para a elaboração do anteprojeto, sejam pelas propostas colhidas em audiências públicas nas principais capitais do país, sejam igualmente pelos fartos materiais enviados pelas entidades de classe e instituições de ensino, somando-se àquelas trazidas pelos cidadãos no site do Senado Federal. Todas foram analisadas. Aproximadamente 80% já estavam na linha de pensamento da Comissão. Daquelas que não se havia abordado, portanto inovadoras, também em média de 80% foram acolhidas. Constata-se, notoriamente, pela simples estatística, convergência de ideais e ideias, e que os anseios são comuns. O tempo é agora. O Código é da nação brasileira, sem sombra de dúvidas. Cabe lembrar, por fim, que esse é o primeiro Código de Processo Civil a ser aprovado num Estado Democrático de Direito, diferentemente, portanto, dos anteriores. Uma lei verdadeiramente popular!

Por Jansen Fialho de Almeida
Fonte: Direito & Justiça

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