segunda-feira, 31 de maio de 2010

Maternidade socioafetiva é reconhecida no STJ

Decisão inédita
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a maternidade socioafetiva deve ser reconhecida, mesmo no caso em que a mãe tenha registrado filha de outra pessoa como sua. “Não há como desfazer um ato levado a efeito com perfeita demonstração da vontade daquela que, um dia, declarou perante a sociedade ser mãe da criança, valendo-se da verdade socialmente construída com base no afeto”, afirmou em seu voto a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso.

A história começou em São Paulo, em 1980, quando uma imigrante austríaca de 56 anos, que já tinha um casal de filhos, resolveu pegar uma menina recém-nascida para criar e registrou-a como sua, sem seguir os procedimentos legais da adoção – a chamada “adoção à brasileira”. A mulher morreu nove anos depois e, em testamento, deixou 66% de seus bens para a menina, então com nove anos.

Inconformada, a irmã mais velha iniciou um processo judicial na tentativa de anular o registro de nascimento da criança, sustentando ser um caso de falsidade ideológica cometida pela própria mãe. Para ela, o registro seria um ato jurídico nulo por ter objeto ilícito e não se revestir da forma prescrita em lei, correspondendo a uma “declaração falsa de maternidade”. O Tribunal de Justiça de São Paulo foi contrário à anulação do registro e a irmã mais velha recorreu ao STJ.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, se a atitude da mãe foi uma manifestação livre de vontade, sem vício de consentimento e não havendo prova de má-fé, a filiação socioafetiva, ainda que em descompasso com a verdade biológica, deve prevalecer, como mais uma forma de proteção integral à criança. Isso porque a maternidade que nasce de uma decisão espontânea – com base no afeto – deve ter guarida no Direito de Família, como os demais vínculos de filiação.

“Permitir a desconstituição de reconhecimento de maternidade amparado em relação de afeto teria o condão de extirpar da criança – hoje pessoa adulta, tendo em vista os 17 anos de tramitação do processo – preponderante fator de construção de sua identidade e de definição de sua personalidade. E a identidade dessa pessoa, resgatada pelo afeto, não pode ficar à deriva em face das incertezas, instabilidades ou até mesmo interesses meramente patrimoniais de terceiros submersos em conflitos familiares” disse a ministra em seu voto, acompanhado pelos demais integrantes da Terceira Turma.

Fonte: STJ

Penhora online

Pescando algo
Os juízes estaduais de São Paulo têm sido cautelosos não só no uso da penhora online de imóveis. Eles passaram a usar o sistema de bloqueio de automóveis, implantado há quase dois anos no país, somente neste mês, de acordo com o Conselho Nacional de Justiça. O órgão registrou apenas 157 pedidos no Estado até sexta-feira. A baixa adesão aos novos sistemas repete o histórico vivenciado com a penhora online de contas correntes, o chamado sistema Bacen Jud. Até 2006, apenas 30% dos juízes estaduais paulistas estavam cadastrados no sistema. Até serem obrigados por meio de uma resolução do Tribunal de Justiça de São Paulo a aderir ao programa do Banco Central.

Fonte: Jornal Valor Econômico

domingo, 30 de maio de 2010

Pérolas Jurídicas - Carga Virtual

Descontração
Com o avanço tecnológico, muitos órgãos da justiça já utilizam processos virtuais, como é o caso do Juizado Especial de Cacoal-RO.
Essa modernização, muita das vezes, acaba gerando situações engraçadas.
No Juizado Especial acima citado, por exemplo, um advogado mineiro, estufou o peito e com sua carteira da OAB nas mãos, não pensou duas vezes e disse ao escrivão:
- Por favor, quero carga dos autos.
O escrivão, então, tentou esclarecer que o órgão já utilizava processos virtuais, porém o advogado, sem perder a pose, disse:
- Então quero carga do processo virtual !!!

Depois de muita risada, situação foi esclarecida.

Colaboraçao de Pedro Henrique Bicalho Carvalho
Fonte: Boletim Jurídico

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Reformas Promissoras

Esperança
Depois de décadas a deprecar atualização, as leis processuais vão ganhar dois novos Códigos. O de Processo Penal, na soleira de votação e aprovação, deverá introduzir os avanços culturais democráticos da Constituição nas leis processuais, onde os princípios do contraditório, da ampla defesa, do conteúdo fático e jurídico da igualdade da partes, além,— com melhor razão — do devido processo legal que se transplanta do sistema inquisitorial para o acusatório. E o de Processo Civil, com a constituição de uma comissão de alto quilate para adequá-lo às transformações da sociedade, em trânsito, na revolução informacional.

Os papeis, os autos, os carimbos, as costuras, as prateleiras a armazenar termos e compromissos cartoriais, em meio a ritos e rituais de antanho, duelos linguísticos, porfias de formalidades, cederão, prontamente, espaços ao substancial acesso à Justiça, que se revela na pronta chegada à porta de saída: a realização do chamado direito objetivo e na tutela dos direitos individuais e coletivos — resgatar do outro a necessidade que o oprime. Agendas, cronogramas de trabalho, malas diretas, digitalização de formulários e conteúdos ocuparão o espaço dos volumes. E suprimirão rotinas cartoriais centenárias.

A sociedade de informação chegou e se estabeleceu. Ultrapassou em maior ou em menor medida o Estado da Arte, a técnica, a ciência. A tecnologia e os multimeios deram-lhe dinâmica contínua e assimetria. Aproximou distâncias físicas e expandiu noções temporais. A prestação de serviços, públicos e privados, liquefez fronteiras formais e substanciais.

Conflitos sociais radicados na estreita canalização da litigiosidade incrustada em concepções superáveis, a reivindicar vias e estruturas conciliatórias, a demover contendas e ordálias, seja por educação, seja por métodos legais, democráticos e igualitários, a justificar no processo de adaptação social originais paradigmas. Novas leis processuais, que são o método legal de obtenção das tutelas e da realização da ordem jurídica republicana, representativa, e igualitária, devem contribuir para o processo. E o processo revelará o seu perfil e o seu papel. Não foi à toa que Pontes de Miranda anunciou o Direito Processual situado mais rente à vida.

Além da extensão da conciliação, como inovação cultural e legal, a renovação da jurisdição constitucional processual pode encaixar outros princípios na estrutura das reformas, como a concentração de atos relativos a procedimentos, argumentos racionais de método (processo) e substância (conteúdo) das defesas. A proliferação de recursos, aparentemente sintéticos da controvérsia, equivaleu à superposição, reiteração, reprodução de variação nominal de matéria basta e já debatida a se espraiar horizontal e verticalmente no organograma dos órgãos jurisdicionais e no fluxograma expansível de seus trâmites, “cabimentos”, “não conhecimento”, a colocar entraves no movimento da máquina. Além do custo do litígio para as partes e para os contribuintes. O princípio da concentração trará o descortino das teses, provas, prazos, argumentos, e o tirocínio dos autores e dos juízos deduzidos e proferidos.

Bibliografias, dissertações e prateleiras serão destinadas à história das fontes e da evolução do Direito Processual. Um novo lugar e um moderno conteúdo para os títulos e capítulos do figurino da ação, do processo, da partes e da prestação jurisdicional.

Por Alexandre Luna Freire
Fonte: Direito & Justiça

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Relator deve rejeitar plebiscito sobre maioridade

Maioridade Penal
O relator da proposta que autoriza a realização de plebiscito para definir a idade para a maioridade penal, deputado Paulo Cesar (PR-RJ), deverá recomendar a rejeição da proposta pela Comissão de Seguridade Social e Família. Durante audiência pública nesta terça-feira, Paulo Cesar afirmou que vai apresentar seu parecer sobre o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) 129/07 no próximo mês.

Segundo o relator, a audiência pública influenciou em sua decisão de rejeitar o plebiscito previsto no projeto. Representantes do governo, do Judiciário e da sociedade civil defenderam a inconstitucionalidade do projeto durante o debate.

Alternativas
Hoje, a maioridade penal no Brasil é de 18 anos, ou seja, nenhuma pessoa que tenha menos de 18 anos pode ser responsabilizada por crimes e punida com base no Código Penal (Decreto-Lei 2848/40). Quem tem entre 12 e 18 anos e comete alguma infração fica sujeito às medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA Lei 8.069/90 ).

O PDC 129/07, do deputado Manato (PDT-ES), prevê um plebiscito com quatro alternativas: diminuição da idade penal para 14 anos; para 15 anos; para 16 anos; e manutenção da legislação em vigor. A proposta, em análise pela Comissão de Seguridade, já foi rejeitada pela Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado.

Posição do Executivo
A coordenadora-geral do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), Margarida Munguba, disse que é contrária à definição da maioridade penal por meio de plebiscito. O Conanda é vinculado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.

Munguba afirmou que as políticas públicas para o setor devem ser definidas pelo Plano Decenal de Garantia dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes, em fase de elaboração. O plano tomará como base as diretrizes aprovadas na 8ª Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, realizada em dezembro de 2009.

Inconstitucionalidade
O procurador Paulo de Souza Queiroz, da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, observou que a proposta pretende alterar uma das chamadas cláusulas pétreas da Constituição, referentes a direitos e garantias individuais, o que só poderia ocorrer por meio de uma nova Carta. "Segundo a interpretação mais corrente da doutrina, nem mesmo por emenda constitucional seria possível a redução da idade penal", afirmou.

A subsecretária de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente da Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República, Carmen Oliveira, destacou que a proposta também viola tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário. Segundo Oliveira, a inclusão escolar é a melhor saída para diminuir a violência praticada por adolescentes. "Estatisticamente, a cada 100 registros policiais, apenas 10% são de adolescentes", informou.

A coordenadora do Conanda ainda citou pesquisa da Organização das Nações Unidas (ONU), realizada em 57 países, a qual mostra que em apenas 17% dos Estados pesquisados a idade mínima para punição é inferior a 18 anos.

Fonte: Agência Câmara

terça-feira, 25 de maio de 2010

Quadra Virtual da Fidelidade Conjugal

Pulada cibernética
A internet pode ser considerada como um instrumento facilitador. Facilita o trabalho, o acesso à informação, o consumo, a comunicação e, também, no âmbito das relações conjugais, podemos dizer que ela facilita a traição. A troca de mensagens virtuais que revelem um envolvimento amoroso com terceiro evidencia a quebra do dever de fidelidade, enunciado pelo Art. 1.566 do Código Civil brasileiro.

Fidelidade remete à lealdade de um dos cônjuges para com o outro e o descumprimento desse dever ocorre, genericamente, de duas formas: por meio da conjunção carnal de um dos cônjuges com um terceiro (adultério) ou de atos que não revelem, à primeira vista, a existência de contato físico, mas que demonstrem a intenção de um comprometimento amoroso fora da sociedade conjugal (quase-adultério). O simples descumprimento do dever de fidelidade, seja pelo adultério ou pelo quase-adultério, é suficiente para embasar pedido de separação judicial litigiosa (Art. 1.572 do Código Civil).

E como comprovar a infidelidade virtual? Se as cópias de e-mails e mensagens em sites estão gravadas e disponíveis em um computador que seja de uso comum da família e não seja necessária senha de uso pessoal para acessá-las, a apresentação desse material em juízo é válida. No entanto, se o computador é de uso pessoal e se, para acessar as mensagens, se faz necessária a inserção de senha, é preciso que o outro cônjuge autorize o acesso, sob pena de estar configurada ofensa à garantia constitucional da intimidade e vida privada e da prova ser invalidada.

Demonstrada a infidelidade em um pedido de separação judicial litigiosa, quais serão as consequências da traição? Nesse ponto devem ser feitas algumas ponderações. O Art. 1.578 do Código Civil estabelece que o cônjuge declarado “culpado” na separação judicial perde o direito de usar o sobrenome do outro, desde que o cônjuge “inocente” requeira. A alteração no nome não será feita se a retirada do sobrenome causar prejuízo ao “culpado”. Já o Art. 1.704 observa que o cônjuge “culpado”, caso venha a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, poderá reivindicá-los do outro cônjuge, mas apenas em valor suficiente para sua sobrevivência.

Ocorre, no entanto, que as referidas consequências podem ser analisadas independentemente da aferição da culpa pela separação. A questão da retirada do nome pode ser analisada apenas pela perspectiva do prejuízo de sua supressão. O dever de alimentos, por sua vez, pode ser examinado diante da perspectiva da necessidade/possibilidade, o que independe da apreciação da culpa. Dessa forma, o entendimento de grande parte dos tribunais brasileiros e da doutrina contemporânea de direito de família é no sentido de não mais se declarar a culpa na separação. A ideia é a de que discutir culpa na separação é abrir espaço para um debate inócuo, desconsiderando que o rompimento da relação é resultado de uma sucessão de acontecimentos e desencontros próprios do convívio e das fragilidades pessoais de cada cônjuge. Assim, questões como a “traição virtual”, apesar de poderem justificar o pedido de separação judicial litigiosa, não implicam “punição” ao cônjuge infiel.

E se a infidelidade não foi apenas causa do fim do casamento, mas, também, motivo de aniquilação da honra do cônjuge ofendido, que implique para ele dificuldades e abalos psíquicos consideráveis? Nesse caso, será possível a reparação pelo dano moral sofrido, tratando da responsabilidade civil no âmbito das relações familiares sem buscar a punição do cônjuge infiel, mas sim reparar o dano moral sofrido por quem foi surpreendido e abalado pela infidelidade.

Concluímos, portanto, que a traição virtual pode representar a quebra do dever de fidelidade e justificar o pedido de separação judicial. No entanto, o cônjuge traidor não será declarado culpado pelo fim do casamento nem sofrerá sanções específicas na separação por seu comportamento. Não quer dizer, no entanto, que quem sofre com a traição deva amargurá-la para sempre. Se o dano sofrido foi substancial, sua reparação, no âmbito da responsabilidade civil, pode ser avaliada.

Por Juliana Marcondes Vianna
Fonte: Direito & Justiça

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Judiciário autorizou 10,5 mil escutas telefônicas

Na escuta
O Conselho Nacional de Justiça está de olho nas autorizações de interceptações telefônicas pelo Judiciário. O órgão recebem, mensalmente, informações dos juízes que acolheram pedidos da polícia ou do Ministério Público e autorizaram as escutas. Atualmente, há 10,5 interceptações telefônicas em curso no Brasil, conforme revela um levantamento do CNJ. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.

"É um número relativamente pequeno de interceptações, não é nada para um país de 180 milhões de habitantes", avaliou a juíza auxiliar da Corregedoria do CNJ, Salise Monteiro Sanchotene. O órgão mantém controle sobre o número de escutas para evitar abusos da própria Justiça.

De acordo com o delegado Luiz Fernando Corrêa, diretor-geral da Polícia Federal, a PF faz monitoramento de comunicações em 391 casos. Corrêa defende uma mudança na lei das interceptações: "Não podemos enfrentar adequadamente a criminalidade organizada com esse estágio atual de tecnologias", afirma Corrêa. "A privacidade a serviço do crime não interessa para a sociedade."

A Polícia Federal, inclusive, já divulgou um novo sistema de interceptação telefônica que facilitará os trâmites com o Judiciário. O Sistema de Interceptação de Sinais (SIS) exclui as operadoras telefônicas e permitirá que a autorização de escutas seja feita pela internet. Na prática, Polícia e Ministério Público encaminharão ao juiz responsável pelo caso investigado, por meio de um sistema eletrônico, o pedido de interceptação, incluindo e-mails, VOIPs e comunicação de dados. Se o juiz autorizar a interceptação, policiais e procuradores serão informados. O juiz também vai ordenar, por meio do mesmo sistema, o início das interceptações.

Um aparelho ficará instalado nas centrais das operadoras de telefonia para que o sinal das ligações seja imediatamente transferido para a Polícia, que passará a estocar e a decodificar as ligações. As empresas de telefonia não terão nenhuma informação de que um de seus clientes está sob investigação e tem suas conversas gravadas pela PF.

A PF afirma que o novo sistema evitará possíveis vazamentos nas operadoras e, ao retirar das empresas a obrigação de efetivar as interceptações, reduzirá custos. Hoje, as empresas de telefonia sabem desde o início qual cliente está sob investigação. A ordem do juiz para que uma pessoa tenha suas ligações gravadas é comunicada diretamente às operadoras, responsáveis por operacionalizar os desvios de voz para escutas telefônicas.

Para a Ordem dos Advogados do Brasil, o novo sistema diminuirá o risco de vazamentos e o CNJ adquiriu legitimidade para fiscalizar informalmente as interceptações. O presidente da entidade, Ophir Cavalcante, considerou positivo o controle informal que Judiciário passará a ter sobre as escutas. "Não caberá ao Judiciário analisá-las, mas haverá um controle de quem as autorizou e dentro de que investigação."

O advogado criminalista Alberto Zacharias Toron concorda. "Vejo isso como um avanço tecnológico importante", disse. No entanto, eles destacam que o novo sistema não resolve o problema de abusos nas escutas. De acordo com o criminalista Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, a interceptação deveria ser usada apenas como último recurso. "Existem dois interesses em jogo: o da investigação e o da liberdade individual. Não é possível que o segundo se submeta a uma fúria investigatória", disse.

Fonte: Conjur

sábado, 22 de maio de 2010

SOBRE O ENSINO JURÍDICO NOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA

Outra realidade
Contribuição enviada por Ludmila Oliveira e Tarcísio Magalhães,estudantes do 7º período da Faculdade de Direito da UFMG, intercambistas na University of Wisconsin-Madison.

Em julho de 2008, recebemos a notícia de que havíamos sido aprovados no Programa de Mobilidade Discente Internacional do Departamento de Relações Internacionais da Universidade Federal de Minas Gerais para cursar o segundo semestre de 2009 na University of Wisconsin-Madison, nos Estados Unidos da América. Ficamos extremamente felizes, mas, ao mesmo tempo, receosos de como seria estudar em uma universidade em outro país, cujo sistema jurídico é tão diverso do nosso. Por se tratar de um país adepto do Common Law, optamos por cursar disciplinas relacionadas ao Direito Internacional, além de Direito Americano.

O meio acadêmico nos Estados Unidos é extremamente diferente do brasileiro: a faculdade, os professores, os alunos, o estilo das aulas, as formas de ensino e aprendizado, os métodos avaliativos e por aí em diante…

Vejamos:
Primeiramente, vale ressaltar que o curso de Direito é uma pós-graduação (chamada de graduation). Em outras palavras, é necessário ter um diploma de um curso de 4 anos (undergraduation) para ingressar na faculdade de Direito. O curso de Direito dura, em média, 3 anos e, a partir do 2 ano, a grade curricular é montada pelo próprio aluno.

Os professores—que, quase à unanimidade, não desempenham outra atividade que não a do magistério—, sempre enviam, alguns dias antes do início das aulas, e-mails, para todos os alunos matriculados na disciplina, com o cronograma do curso (o syllabus), contendo todas as tarefas e leituras referentes a cada aula do semestre. É obrigatório que todos os alunos leiam todo o material indicado para cada dia de aula; uma leitura bastante extensa, incluindo, muitas vezes, vários capítulos de um livro. O syllabus contem tarefas, inclusive, para o primeiro dia de aula. Por isso, uma semana antes das aulas começarem, a biblioteca fica repleta de alunos cumprindo suas respectivas tarefas agendadas para o primeiro dia.

O material didático é composto de Casebooks, isto é, livros com pouca explicação da matéria e muitos casos. O alunos aprendem sempre com base em casos, pois o ensino jurídico americano é muito voltado para o caso concreto e o Direito na prática.

O ensino nas faculdades de Direito norte-americanas se baseia no método socrático, ou seja, os professores tendem a responder às perguntas dos alunos sempre com outra pergunta, estimulando a discussão e o debate, de modo a construírem, professor e aluno, o conhecimento juntos. Diz-se que, nas salas de aula americanas, o professor e os alunos se encontram em pé de igualdade, ambos buscando aprender. Os alunos são constantemente incentivados a questionarem e a participação é sempre considerada na hora da pontuação. Logo, as aulas de Direito nunca são expositivas, mas sempre discursivas. O professor ministra sua aula dirigindo perguntas aos alunos, as quais devem ser respondidas com base na leitura prévia. Por essa razão, as turmas são, em sua maioria, bem reduzidas (cursamos uma matéria, por exemplo, na qual somente 10 pessoas estavam matriculados).

Outra discrepância com o nosso sistema são os métodos avaliativos. Em primeiro lugar, as notas são dadas quase sempre em curva. Isso significa que a nota de cada aluno é atribuída em comparação com a do colega. Via de regra, somente 10% da classe pode obter conceito A, 25% B, 35% C, 30% D, alguns poucos sendo reprovados. Tal sistema proporciona uma forte competição entre os alunos. Cada um estuda com seus próprios materiais e ninguém empresta anotações, resumos ou similares, vez que, se um aluno ajudar o outro, estará se prejudicando. Por fim, os alunos recebem suas notas contendo a posição na qual eles se encontram perante o restante da turma, ou seja, suas colocações em um ranking de melhores alunos. Isto é de extrema importância para os alunos de Direto, pois os grandes escritórios valorizam boas notas e contratam apenas os mais bem conceituados.

Os professores tem total liberdade para escolher como os pontos do semestre serão distribuídos. Alguns optam pela elaboração de artigos, outros mesclam artigos e provas escritas e ainda tem aqueles que decidem aplicar somente uma prova ao final do semestre. Em função do próprio sistema jurídico norte-americano, os professores não levam em conta, na hora da avaliação, se o aluno decorou cada trecho do livro ou se gravou cada palavra dita em sala de aula. O relevante é que as respostas às questões nas provas e o raciocínio apresentado nos artigos sejam capazes de convencer o professor. O que se busca desenvolver e aperfeiçoar é sempre a persuasão. Os alunos de Direito estadunidenses são treinados a ganharem casos, o que é feito provando ser seu argumento o melhor e destruindo o argumento adversário.

Finalmente, um aspecto que nos marcou é a estrutura fornecida pela universidade, principalmente para pesquisa. Existem 56 bibliotecas no campus, sendo muitas delas 24 horas. As bibliotecas são equipadas com máquinas de xerox e scanners, cafeteria, computadores, máquinas de refrigerante e salgadinhos, sofás... Enfim, tudo o que o aluno possa precisar. Além do vastíssimo banco de dados da própria universidade (para se ter uma idéia, é possível ler a Folha de São Paulo através do site da biblioteca, dentre outros milhares de jornais, revistas e artigos de toda parte do globo), existe ainda um convênio celebrado entre a University of Wisconsin-Madison e diversas outras universidades do mundo (inclusive a USP), por meio do qual o aluno pode encomendar, via internet, um livro que se encontra em outra biblioteca (no Brasil, na Europa, etc.) sem qualquer custo adicional. Ademais, não há limite máximo de livros por aluno e as bibliotecas emprestam, além de livros, é claro, DVDs, jogos de video game e, até mesmo, notebooks e carregadores, tudo com a simples apresentação da carteira da biblioteca. Por último, existem equipes espalhadas pelo campus para auxiliar os alunos na elaboração de artigos e resolução de exercícios, corrigindo e dando dicas.

Esperamos que as informações tenham ajudado àqueles que queiram embarcar nessa aventura do intercâmbio acadêmico internacional. Nos colocamos à disposição para responder eventuais dúvidas sobre moradia, visto, passagem, gastos etc., e, obviamente, sobre o sistema de ensino norte-americano. Basta entrar em contato!

Fonte: Blog Magistério Jurídico

sexta-feira, 21 de maio de 2010

CNJ não tem competência para rever decisão judicial

No devido lugar
O Conselho Nacional de Justiça é um órgão com competência administrativa e não tem competência para julgar decisão judicial. O papel do órgão se detém a analisar questões administrativa, financeira e funcional do Poder Judiciário. Com esse entendimento o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, rejeitou Mandado de Segurança contra decisão do CNJ que arquivou Pedido de Providência que questiona decisão de uma juíza de primeiro grau.

O autor do processo no Conselho Nacional de Justiça pediu a suspensão do processo judicial e suspeição da juíza que analisou o caso. Por se tratar do questionamento de uma sentença judicial, o CNJ arquivou o processo. Segundo Celso de Mello, a decisão foi correta, já que não havia “qualquer medida, pelo menos a partir dos fatos narrados, que possam ensejar a atuação do CNJ”. “As decisões dos magistrados no âmbito do processo não são passíveis de revisão pelo CNJ, cuja competência, como bem ressaltaram os requerentes, cinge-se à esfera administrativa, envolvendo também a fiscalização da atuação funcional do juiz”, afirmou em voto.

O ministro ressaltou que o CNJ só deveria agir se tivesse sido registrado ofensa aos deveres funcionais do juiz. O que as partes pretendiam com o recurso era modificar o entendimento de uma decisão não favorável a eles, situação que deve ser coibida. Parecer do Ministério Público no processo reforçou o entendimento de que o papel do CNJ “se restringe ao controle da atuação administrativa e financeira o Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, vedado o reexame dos atos de natureza jurisdicional”.

Para que o Mandado de Segurança possa ser analisado, segundo o ministro, ele deveria ter sido impetrado contra a juíza de primeira instância e não contra o CNJ. “No caso em análise, a deliberação do Conselho Nacional de Justiça traduziu mero reconhecimento de que “as decisões dos magistrados no âmbito do processo não são passíveis de revisão pelo CNJ, cuja competência (...) cinge-se à esfera administrativa (...)”.

“Não se desconhece que o Conselho Nacional de Justiça – embora incluído na estrutura constitucional do Poder Judiciário – qualifica-se como órgão de caráter eminentemente administrativo, não dispondo de atribuições institucionais que lhe permitam exercer fiscalização da atividade jurisdicional dos magistrados e Tribunais”, disse o relator. O ministro Celso de Mello citou que o Supremo já se pronunciou sobre a matéria quando do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.367, motivo pelo qual não conheceu do MS e determinou o arquivamento dos autos.

Por Fabiana Schiavon
Fonte: Conjur

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Senado aprova monitoramento eletrônico de presos

Tornozeleira Eletrônica
O Plenário do Senado aprovou o projeto de lei (PL 175/07) que permite o monitoramento eletrônico do condenado que cumpre pena em regime aberto. A medida altera a Lei de Execução Penal (Lei 7.210/84) e pode ser adotada por decisão do juiz. A proposta, aprovada nesta quarta-feira (19/5), será encaminhada para avaliação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A autoria do projeto é do senador Magno Malta (PR-ES).

Na prática, a tornozeleira ou pulseira indicará distância, horário e localização do detento, além de outras informações úteis à fiscalização judicial. O relator do projeto na Comissão de Constituição e Justiça, senador Demostenes Torres (DEM-GO), argumentou que não há ofensa à integridade física e moral do preso na proposta. Ele informou que diversos estados brasileiros já fizeram testes com a pulseira eletrônica e aguardam a aprovação da lei para implantar o sistema.

De acordo com Torres, o dispositivo viabiliza a concessão de benefícios penais aos condenados. Entre eles estão regime aberto, semi-aberto, livramento condicional, suspensão condicional de pena, saídas temporárias no regime semi-aberto.

Caso o juiz da execução penal entenda necessário, o acessório poderá ser usado até mesmo no regime fechado. Também se aplica aos casos de pena restritiva de direito que limite horários ou frequência a determinados lugares. Nesse caso, o condenado terá que fornecer o endereço da família e onde poderá ser encontrado enquanto estiver usufruindo o benefício.

À noite, terá que se recolher à residência da família. Bares, casas noturnas e estabelecimentos similares ficam proibidos. Para frequentar curso profissionalizante, de ensino médio ou superior, ele só poderá se manter fora o tempo necessário. Com informações da Assessoria de Imprensa do Senado.

Fonte: Conjur

Mudança no Código de Processo Penal que restringe o uso de habeas corpus é criticada pela OAB

Mudanças
O presidente da comissão da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que estuda o Projeto de Lei do Senado (PLS nº 156/09) do novo Código do Processo Penal, René Ariel Dotti, criticou a proposta de restrição ao uso de habeas corpus previsto na reforma.

Constitucionalmente, o habeas corpus é um instrumento de garantia da liberdade individual, mas, segundo o projeto, ele somente é cabível quando se tratar de falta de justa causa para a prisão”, afirmou Dotti, durante sessão plenária do Conselho Federal da OAB que contou com a presença do Senador Renato Casagrande que fez um relato sobre o andamento do projeto de lei que altera do código de 1941.

Para Dotti, o dispositivo é inconstitucional porque a Carta Magna de 1988 estabelece que o habeas corpus é cabível sempre que houver ameaça ou coação por ilegalidade à liberdade ou abuso de poder.

Apenas na ditadura militar houve restrição ao seu uso nos casos de crimes contra a economia popular e contra a segurança nacional”, destacou.

O presidente da comissão lamentou também o não acolhimento de várias propostas da OAB. Das 21 sugestões de emendas encaminhadas pela OAB, apenas quatro foram aceitas. Uma das sugestões descartadas foi a que considera suspeito o juiz que se manifestar antecipadamente, pela imprensa, sobre o mérito de uma causa sob sua jurisdição.

O argumento é que poderia constituir uma espécie de mordaça, mas muitos juízes sentem-se seduzidos pela oportunidade de uma entrevista e acabam perdendo a imparcialidade necessária para julgar, salientou.

O Senador Renato Casagrande explicou que ainda há possibilidades de alteração do projeto de lei que deve ser votado este mês, mas ratificou a necessidade de restrição ao uso de habeas corpus.

Em 2008, 27 mil pedidos de habeas corpus foram encaminhados ao Superior Tribunal de Justiça e mais 5 mil pedidos foram julgados no Supremo Tribunal Federal. O habeas corpus se transformou em medida para protelar o processo”, destacou o parlamentar.

Outros pontos destacados pelo senador são a maior agilidade nos processos judiciais e as novas formas de monitoramento de pessoas em fase de julgamento para evitar as prisões temporárias.

Hoje o único caminho de quem é preso em flagrante ou estiver sendo investigado é a prisão provisória, mas existem outras formas como o monitoramento eletrônico e a prisão domiciliar. Precisamos acabar com a fábrica de presos no Brasil, afirma o senador.

Por Lisiane Wandscheer
Fonte: Agência Brasil

quarta-feira, 19 de maio de 2010

STJ muda entendimento sobre prescrição penal

Esforço inútil
A 3ª seção do STJ aprovou no início de maio a súmula 438 que entende ser inaplicável a prescrição virtual, antecipada ou em perspectiva. Na prática, isso significa que muitos casos em que a extinção da punibilidade se daria prontamente, serão postergados para que sejam assim declarados em oportunidade posterior.

Para entender melhor a questão é necessário pequena digressão sobre o assunto. Com a ocorrência do fato delituoso nasce para o Estado jus puniendi (pretensão punitiva) direito que não pode se eternizar ameaçando indefinidamente os indivíduos. Por isso há critérios limitadores para o exercício do direito de punir, já que o Estado assumiu e avocou para si tal tarefa, abandonando-se a vingança privada. Vale dizer que os tais critérios limitativos levam em conta a gravidade da conduta e a sanção correspondente. Dessa forma, escoado o prazo sem que o Estado tenha agido, ocorrerá a prescrição, não sendo mais possível punir o infrator. A prescrição é, pois, a perda do direito de punir do Estado, pelo decurso do tempo, em razão do seu não exercício, dentro do prazo razoavelmente fixado. É, portanto, causa de extinção da punibilidade (Art. 107, IV, Código Penal).

No que diz respeito ao surgimento da prescrição, há notícias de que o primeiro texto legal que dela tratou foi a Lex Julia, no século XVIII a.C., sendo que a prescrição da condenação só apareceu na França, no século XVIII. No Brasil, somente a partir de 1890 é que se anotou o termo “prescrição da condenação” (art. 72), sendo que a prescrição da ação já existia entre nós desde o Código Penal de 1830.

Prescrição é considerada matéria de ordem pública, devendo ser decretada de ofício em qualquer momento processual e em qualquer instância. É alegação que tecnicamente deve ser apresentada como preliminar de mérito, já que uma vez ocorrida o magistrado não pode apreciá-lo. Também é de se notar que sempre foi instituto polêmico por permitir a liberação de um criminoso pelo lapso temporal.

Mas há fundamentos políticos apresentados justificando a existência do instituto: a) O decurso do tempo leva ao esquecimento do fato; b) O decurso do tempo leva à recuperação do criminoso; c) O Estado deve arcar com sua inércia; e, d) O decurso de tempo enfraquece o suporte probatório.

A regra geral é a de que todas as infrações penais são prescritíveis. Todavia, a nossa Constituição declara imprescritíveis o racismo e a ação de grupos armados contra a ordem constitucional e o Estado Democrático de Direito (art. 5º, XLII e XLIV, CF/88).

Para total compreensão da decisão do STJ ainda é preciso discorrer brevemente sobre as modalidades de prescrição. Com a prática de um delito, o direito abstrato de punir do Estado concretiza-se, de modo a contraporem-se o direito estatal e o direito de liberdade do indivíduo. Aquele que pratica um delito deve ser processado e condenado. Quando condenado, o direito do Estado, que era o de punir, transforma-se em outro, o de executar a punição. O jus puniendi transforma-se em jus punitionis. É da distinção desses direitos que surge a classificação das prescrições: prescrição da pretensão punitiva e prescrição da pretensão executória.

A prescrição da pretensão punitiva subdivide-se em três: prescrição abstrata, prescrição retroativa e prescrição intercorrente. O que importa para fins da discussão da súmula 438 do STJ é a prescrição retroativa, que leva em conta a pena aplicada em concreto na sentença condenatória. É assim contada, pois com a sentença se tem a pena justa, merecida por quem cometeu a infração penal.

A prescrição que o STJ nega aplicação é a prescrição da pretensão punitiva antecipada, virtual ou em perspectiva, que é o caso em que o juiz decretaria a extinção da punibilidade do réu (não mais poderia ser punido por conta do lapso temporal) quando notasse que a pena a ser virtualmente aplicada (a que seria, em tese, cabível ao acusado) fosse de tal ordem que o instituto da prescrição incidiria no momento da sentença. Isto é, impedir-se-ia que um processo tramitasse inutilmente para que, ao final, fosse decretada a impossibilidade de se punir o réu porque incidiu a prescrição.

Contudo, pode-se dizer que o STJ sumulou entendimento que, embora viesse sendo aplicado correntemente (por exemplo, pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, o do Rio Grande do Sul, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região) não era amparado por disposições legais, mas por interpretação do que seja “interesse processual”.

Em outros termos: preferiu-se pela estrita aplicação legal, entendendo-se indisponível a ação penal, a prestigiar-se entendimento racionalizante de processos inúteis, considerando a falta de interesse processual, evitando causas em trâmite por mais tempo, mas que serão, de qualquer modo, julgadas nos termos de extinção da punibilidade em algum momento.

Por Marcelo Xavier de Freitas Crespo
Fonte: Direito e Justiça

terça-feira, 18 de maio de 2010

Desrespeito ao uso de imagem em razão de contrato assinado no exterior pode ser julgado no Brasil

Imagem é tudo
A Justiça brasileira pode ser acionada em caso de violação no exterior ao direito de imagem, constatada pela internet, sendo que o contrato entre as partes fixava a Espanha como foro e envolvia uma cidadã que vive no Brasil? A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que sim. Por unanimidade, os ministros negaram o recurso da empresa World Company Dance Show Ltda., que pedia para que a demanda fosse analisada pela Justiça espanhola.

De acordo com informações do processo, em 2004 a cidadã havia firmado contrato temporário com a World Company Dance Show para prestar serviços como dançarina e assistente de direção em show típico brasileiro, com apresentações nos continentes europeu e africano. Só que, meses após o término do acordo, ao acessar o endereço eletrônico da empresa, a mulher percebeu que a página continha montagens de imagens dela, recortadas de várias fotografias dos shows em que havia trabalhado, além de outras utilizadas para propaganda. A profissional, domiciliada no Rio de Janeiro, recorreu à Justiça com pedido de indenização por danos materiais e morais, alegando que o contrato vedava expressamente a utilização de imagens, sem prévia autorização, para qualquer fim diverso do pactuado.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) entendeu que a Justiça brasileira é competente para julgar o caso quando a ação se refere a fato ocorrido ou a ato praticado no Brasil. Por isso, o TJRJ concordou com os argumentos da profissional.

No STJ, a empresa sustentou que, embora o site tenha sido acessado em território brasileiro, caberia à Justiça espanhola analisar o caso porque, entre outros motivos, a empresa é espanhola e não possui sede ou filial no Brasil e o contrato de trabalho foi firmado entre as partes na Espanha.

Para o relator, ministro Luis Felipe Salomão, a demanda pode ser proposta no local onde ocorreu o fato, “ainda que a ré seja pessoa jurídica, com sede em outro lugar, pois é na localidade em que reside e trabalha a pessoa prejudicada que o evento negativo terá maior repercussão”, afirmou o ministro. O relator lembrou que a internet pulverizou as fronteiras territoriais e criou um novo mecanismo de comunicação, mas não subverteu a possibilidade e a credibilidade da aplicação da lei baseada nos limites geográficos. Assim, “para as lesões a direitos ocorridos no âmbito do território brasileiro, em linha de princípio, a autoridade judiciária nacional detém competência para processar e julgar o litígio”, arrematou o ministro. Em seu voto, o relator ressaltou que, se assim não fosse, poderia se ter a sensação de que a internet é uma zona franca, por meio da qual tudo seria permitido, sem que desses atos resultassem responsabilidades.

O ministro ainda salientou as hipóteses de jurisdição concorrente estabelecidas no Código de Processo Civil, em que a competência do Poder Judiciário brasileiro não afasta a de outro país. O relator elencou precedentes do Tribunal no sentido de que a cláusula de eleição de foro existente em contrato de prestação de serviços no exterior não impede que a ação seja proposta no Brasil, ainda que se trate de competência concorrente. E como a ação de indenização movida pela profissional não é baseada no contrato em si, mas no uso de fotografias e imagens dela, sem seu consentimento, não há que se falar no foro definido pelo contrato. Os outros ministros da Quarta Turma do STJ acompanharam o voto do relator no sentido de considerar competente a Justiça brasileira para dirimir o conflito, já que o ato foi praticado no Brasil (o acesso ao site da empresa foi feito aqui) e a profissional reside em território nacional.

Fonte: STJ

segunda-feira, 17 de maio de 2010

AMB questiona cumprimento de atos do CNJ

Imparcialidade
A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4412) no Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar a atual redação de dispositivo (art. 106) do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, segundo o qual as decisões e atos do CNJ devem ser imediatamente cumpridos, a não ser que estejam sendo impugnados perante o Supremo Tribunal Federal.

Para a entidade de classe, o dispositivo atribui ao CNJ uma competência que a própria Constituição não lhe reconhece, além de violar o devido processo legal, ao determinar que as decisões judiciais contrárias às suas decisões administrativas não terão eficácia. Na ação, a AMB pede liminar para suspender a eficácia do artigo até decisão final do STF.

O relator é o ministro Gilmar Mendes, ex-presidente do CNJ.

Fonte: Blog do Fred

domingo, 16 de maio de 2010

Tempo de espera de clientes em filas de bancos é um dos temas de RE com repercussão geral reconhecida

Peneira à vista
Entre as últimas decisões do Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF), sistema de votação em que os ministros analisam a existência de repercussão geral nos processos, cinco novos temas presentes em Recursos Extraordinários (REs) tiveram esse instituto reconhecido e serão julgados pela Corte. Os assuntos versam sobre tempo de espera de cliente em filas de bancos, férias de procuradores, precatórios e matéria tributária.

Temas com repercussão geral
Por unanimidade dos votos, os ministros do STF manifestaram-se pela ocorrência de repercussão geral no RE 610221, interposto pela Caixa Econômica Federal (CEF) contra decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que considerou válida lei municipal sobre o tempo de espera de cliente em filas de bancos. A CEF alega que dispor sobre a forma como a empresa de banco deve atender os usuários dos respectivos serviços extrapola o interesse local.

Para a relatora, ministra Ellen Gracie, a matéria apresente relevância econômica, política, social e jurídica, uma vez que o assunto alcança grande número de pessoas por se tratar de questões atinentes às relações de consumo.

Já o RE 566007 foi interposto contra decisão do TRF-4, que entendeu que a desvinculação do produto de arrecadação das contribuições sociais é válida e legítima. Conforme o recurso, isso teria contrariado o artigo 76, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, alterado pela Emenda Constitucional 27/2000.

A matéria constitucional contida neste RE refere-se à possibilidade de emenda constitucional tratar da vinculação de receitas originárias de contribuições sociais da União. A relatora, ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, votou no sentido de não haver repercussão geral no caso, tendo sido acompanhada pelos ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Eros Grau, Cezar Peluso, Ellen Gracie e Celso de Mello. No entanto, são necessários oito votos contrários para que a repercussão geral não seja reconhecida. Assim, o RE terá o mérito julgado pelo STF.

No 568503, a União sustenta que a contribuição ao Programa de Integração Social (PIS) não estaria abrangida pelo princípio da anterioridade nonagesimal, contido no artigo 195, parágrafo 6º, da Constituição Federal. Para a União, tal dispositivo teria sido contrariado tendo em vista que decisão do TRF-4, questionada no recurso, determinou que o artigo 50, da Lei 10.865/04, somente deve ser aplicado após 90 dias da publicação da lei. A relatora, ministra Cármen Lúcia, posicionou-se favorável à repercussão geral e foi seguida por maioria, vencido o ministro Cezar Peluso.

Também de relatoria da ministra Cármem Lúcia e autoria da União, o RE 602381 foi interposto contra ato da Turma Recursal da Seção Judiciária de Maceió e trata da concessão de 60 dias de férias a procuradores federais, prevista nas Leis 2123/53 e 4069/62. Os procuradores argumentam que tais normas teriam sido recepcionadas pela CF como leis complementares. Para a relatora, a matéria apresenta inegável relevância jurídica e econômica por repercutir diretamente no regime jurídico de carreira de grande importância, “além de ter significativo peso no orçamento da União”. Ficaram vencidos os ministros Ricardo Lewandowski, Eros Grau e Cezar Peluso.

Por fim, interposto pelo estado de São Paulo, o RE 605481 versa sobre a necessidade de citação da Fazenda Pública para a expedição de precatório complementar. A ministra Ellen Gracie, relatora do processo, reconheceu a repercussão geral tendo em vista que o tema alcança grande número de credores da Fazenda Estadual que aguardam o pagamento de dívidas por meio de precatório. Foi vencido nesta votação o ministro Eros Grau.

Sem repercussão
Oito recursos não tiveram repercussão geral reconhecida pelo STF, entre os processos analisados mais recentemente pelo Plenário Virtual. São eles: os Recursos Extraordinários (REs) 608852, 609448, 609466, 610218, 610220, 610223 e os Agravos de Instrumento (AIs) 746996 e 783172.

Filtro de recursos
A repercussão geral é um “filtro de recursos” que permite ao STF descartar processos cuja questão debatida não tenha relevância jurídica, econômica, social ou política. Para que o recurso seja rejeitado são necessários os votos de oito ministros, proferidos por meio de sistema de informática, conhecido como Plenário Virtual. Os recursos aceitos são encaminhados para julgamento do mérito pelo Plenário da Suprema Corte.

Fonte: STF

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Em Pernambuco, juíza reconhece união estável entre mulheres

Reconhecimento Oficial
A magistrada Paula Maria Malta, da 11ª Vara da Família e Registro Civil da Capital, considerou procedente o pedido de reconhecimento de união estável entre mulheres. A sentença que reconheceu a existência de entidade familiar foi proferida na sexta-feira, 30 de abril.

Na sua decisão, a juíza Paula Maria diz que se amparou nos princípios da isonomia e dignidade da pessoa humana previstos na Constituição para defender a legitimidade da relação estável entre as duas mulheres. Para ela, pelo fato de a Carta Magna não conter qualquer cláusula que vede a união entre pessoas do mesmo sexo vale a interpretação do direito igual para todos. "Existem requisitos suficientes que comprovam que as duas mulheres dividiram uma vida juntas, tiveram uma relação familiar. E a família é um bem da sociedade que tem proteção especial do estado. A lei se refere a relações entre homem e mulher, mas não fala em pessoas do mesmo sexo. Não há norma expressa que proíba", alegou.

As duas mulheres, que viviam juntas há 22 anos, inclusive criando filhos de relacionamentos que tiveram no passado, não tiveram os nomes divulgados porque o processo corre em segredo de Justiça.

No Brasil, outros pedidos semelhantes foram aceitos pela Justiça, mas o tema ainda é matéria polêmica no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Medidas parecidas foram recebidas nos tribunais do Rio de Janeiro e Minas Gerais.

Fonte: IBDFAM

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Supremo condiciona pedidos a exames criminológicos

Condicionando a Progressão
O Supremo Tribunal Federal negou, nesta terça-feira (11/5), dois Habeas Corpus ajuizados pela Defensoria Pública da União para tentar reverter decisões do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça de São Paulo, que acolheram pedido do Ministério Público Federal para condicionar a progressão da pena de dois condenados ao exame criminológico. O terceiro tratava de um acusado de extorsão.

De acordo com o ministro Ricardo Lewandowski, relator dos dois processos, tanto o TJ quanto o STJ fundamentaram devidamente suas decisões. No primeiro caso, o réu foi condenado por crime hediondo. No segundo, por prática de delitos graves, com emprego de violência. Portanto, nos casos, o tribunal paulista entendeu que seria necessário prudência para colocar esses cidadãos de volta ao convívio social, revelou o ministro Lewandowski.

O HC 103.209 foi ajuizado pela Defensoria em favor de réu condenado a uma pena de mais de 59 anos pelos crimes de roubo e latrocínio. Já o HC 103.224 foi impetrado, também pela DPU, em favor de réu condenando por roubo qualificado à pena de oito anos e sete meses de reclusão.
Nos dois casos, a Defensoria lembrou que o artigo 112 da Lei de Execuções Penais, com a redação dada pela Lei 10.792/03, dispensou exame criminológico para a progressão de regime.

À exceção do ministro Marco Aurélio — que divergiu do relator com o fundamento de que o dispositivo da LEP que exigia o exame para a concessão da progressão de regime foi revogado —, os ministros entenderam que as duas decisões questionadas, favoráveis ao exame, estão devidamente fundamentadas.

Também sobre a necessidade de exame criminológico, os ministros indeferiram o HC 101.942, ajuizado na Corte em favor de réu condenado à pena de 9 anos e 4 meses de reclusão pela prática do crime de extorsão mediante sequestro. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

Fonte: STF

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Resgate da Justiça

Um dos entraves mais notórios à presteza do Poder Judiciário em solucionar os conflitos na ordem social, objeto das demandas que lhe são submetidas, reside nas formalidades e meios recursais previstos na legislação. O projeto do novo Código de Processo Civil (CPC) contempla conjunto de medidas orgânicas e articuladas para propiciar adequada celeridade ao trâmite das ações. Vem para substituir as encanecidas normas do regime atual, estabelecidas no CPC de 1973.

Segundo os especialistas da comissão encarregada de redigir as mudanças na legislação adjetiva, em dimensão codificada, a meta síntese da inovação é reduzir em 70% o tempo para a definição das causas ajuizadas. Não por outra razão, houve extinção de rituais, dispensa de atos burocráticos dependentes dos juízes, mais eficácia da jurisprudência consolidada dos tribunais superiores. Configura-se aí o rompimento de bloqueios que, entre tantos, responde pela lentidão da Justiça.

Assumem importância singular as restrições ao uso de medidas protelatórias. Não serão mais admissíveis os recursos destinados apenas a adiar o proferimento da sentença final. Advogados chicaneiros e, acima de tudo, procuradorias do poder público, se servem do expediente para usufruir vantagens indecorosas. Não surpreende ser de semelhante vertente a origem dos que consideram a reformulação prejudicial à garantia da ampla defesa prevista na Constituição.

A segurança jurídica no tocante ao respeito ao texto constitucional está ressalvada de modo expresso, eis que as restrições aos recursos alcançam apenas os maculados pela má-fé processual e aqueles passíveis de exame em ocasião mais propícia. Daí por que o projeto defere aos patronos das causas, sejam advogados ou procuradores estatais, o direito à apresentação de grande parte das providências recursais na fase final do julgamento.

Sabe-se que o estrangulamento dos tribunais ocorre, de modo significativo, em função de sentenças divergentes da primeira instância em processos idênticos no conteúdo e na causa de pedir. Para evitar a anormalidade, a proposta da comissão, presidida pelo ministro Luiz Fux, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), manda os juízes da jurisdição vestibular seguirem as decisões dos tribunais superiores.

Outra modificação de largo alcance é a que suprime a eficácia imediata da sentença de primeira instância, quando houver recurso. O efeito suspensivo haverá de ser declarado, ou não, por um desembargador. Na dimensão burocrática, ressalte-se, entre as modificações que favorecem a evolução mais acelerada dos processos, o direito conferido aos advogados de intimar as partes. Também tende a obter a mesma agilidade no transcurso das ações o dispositivo que dispensa a Justiça brasileira, em respeito aos tratados internacionais, de decidir conflitos pertinentes à competência de outros países.

Há agora o desafio ao Congresso. Seria catastrófico se, a fim de atender a pressões de grupos, de interesses corporativos ou a conveniências paroquiais, deputados e senadores invalidarem os preceitos que podem injetar dinamismo ao Judiciário e libertá-lo de sua histórica lentidão. Não se quer retirar ao Legislativo o dever de examinar, debater e de até emendar o projeto, como é de sua obrigação. Mas fazê-lo sem frustrar as expectativas de todos os brasileiros.

Por Josemar Dantas
Fonte: Direito e Justiça - Correio Brasiliense

segunda-feira, 10 de maio de 2010

STJ edita novas súmulas

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) editou, no mês de abril, novas súmulas que pacificam o entendimento do Tribunal sobre importantes temas. Os verbetes foram aprovados pela Primeira e pela Terceira Seções da Corte. Confira o teor de cada enunciado, em ordem decrescente, e a notícia já publicada sobre sua aprovação.

Súmula 448: "A opção pelo Simples de estabelecimentos dedicados às atividades de creche, pré-escola e ensino fundamental é admitida somente a partir de 24/10/2000, data de vigência da Lei n. 10.034/2000".

Súmula 447: "Os Estados e o Distrito Federal são partes legítimas na ação de restituição de imposto de renda retido na fonte proposta por seus servidores".

Súmula 446: "Declarado e não pago o débito tributário pelo contribuinte, é legítima a recusa de expedição de certidão negativa ou positiva com efeito de negativa".

Súmula 445: "As diferenças de correção monetária resultantes de expurgos inflacionários sobre os saldos de FGTS têm como termo inicial a data em que deveriam ter sido creditadas".

Súmula 444: “É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”. Leia a notícia sobre a Súmula 444.

Súmula 443: “O aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime de roubo circunstanciado exige fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua exasperação a mera indicação do número de majorantes”. Leia a notícia sobre a Súmula 443.

Súmula 442: “É inadmissível aplicar, no furto qualificado, pelo concurso de agentes, a majorante do roubo”.Leia a notícia sobre a Súmula 442.

Súmula 441: “A falta grave não interrompe o prazo para obtenção de livramento condicional”. Leia a notícia sobre a Súmula 441.

Súmula 440: “Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito”. Leia a notícia sobre a Súmula 440.

Súmula 439: “Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada”. Leia a notícia sobre a Súmula 439.

Súmula 438: “É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal”. Leia a notícia sobre a Súmula 438.

Súmula 437: “A suspensão da exigibilidade do crédito tributário superior a quinhentos mil reais para opção pelo Refis pressupõe a homologação expressa do comitê gestor e a constituição de garantia por meio do arrolamento de bens”. Leia a notícia sobre a Súmula 437.

Para ver a lista completa de súmulas do STJ no site da Corte (www.stj.jus.br), basta clicar em “Consultas”, no menu à esquerda da tela inicial do site, e acessar o link “Súmulas”.

Fonte: STJ

sábado, 8 de maio de 2010

Fiel tem direito de recusar transfusão de sangue

Testemunha de Jeová
É legítima a recusa de tratamento que envolva transfusão de sangue, por parte dos adeptos da religião Testemunhas de Jeová. Essa foi a conclusão do constitucionalista Luís Roberto Barroso, em parecer elaborado a pedido da Procuradoria-Geral do Rio de Janeiro. A religião não recomenda o tratamento, mesmo quando há risco de morte do paciente, por entender que a transfusão de sangue é proibida pela lei divina.

A instituição aprovou o parecer do constitucionalista e encaminhou ao governador Sérgio Cabral, que poderá formular um projeto de lei. A situação vem se repetindo com frequência no Hospital Universitário Pedro Ernesto. Por isso, o diretor Jurídico da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Maurício Mota, pediu parecer normativo ao Ministério Público estadual. O advogado entende que o estado não pode impor procedimento médico recusado pelo paciente. “Em nome do direito à saúde ou do direito à vida, o Poder Público não pode destituir o indivíduo de uma liberdade básica, por ele compreendida como expressão de sua dignidade.”

A opinião de Luís Roberto Barroso chegou para desempatar o placar de pareceres produzidos pelo Ministério Público do estado. O procurador Gustavo Binenbojm foi favorável ao direito de recusa. Ele entendeu que a decisão do paciente de se recusar ao tratamento “é autoexecutória em relação ao médico, na medida em que se baseia diretamente nos direitos fundamentais envolvidos”. Já o procurador-chefe Flávio de Araújo Willeman foi contrário. Para ele, não é aceitável que uma pessoa “sob o fundamento de professar crença religiosa, dentro de um hospital (público ou privado) [possa] impedir o médico de cumprir com sua histórica missão de salvar vidas”.

Para Barroso, a liberdade religiosa e o direito fundamental derivado da dignidade da pessoa humana asseguram a todos o direito de fazer suas escolhas existenciais. Inclusive a de negar tratamento médico. Ele destacou que a ética médica evoluiu nas últimas décadas. “A regra, no mundo contemporâneo, passou a ser a anuência do paciente em relação a qualquer intervenção que afete sua integridade.”

O constitucionalista ressalta que a dignidade da pessoa humana está ligada à autonomia do indivíduo e expressa a liberdade de cada cidadão de fazer suas escolhas existenciais e assumir a responsabilidade delas. “Na Constituição brasileira, é possível afirmar a predominância da ideia de dignidade como autonomia, o que significa dizer que, como regra, devem prevalecer as escolhas individuais.”

Ele reconhece a gravidade da decisão em casos de risco de morte. Por isso, destaca que “para que o consentimento seja genuíno, ele deve ser válido, inequívoco e produto de uma escolha livre e informada”.

Entendimento contrário
Em fevereiro de 2009, o Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás conseguiu autorização da Justiça para fazer transfusão de sangue em um paciente da religião Testemunha de Jeová. Em liminar, o desembargador federal Fagundes de Deus, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, registrou que no confronto entre os princípios constitucionais do direito à vida e do direito à crença religiosa importa considerar que atitudes de repúdio ao direito à própria vida vão de encontro à ordem constitucional. Para exemplificar, lembrou que a legislação infraconstitucional não admite a prática de eutanásia e reprime o induzimento ou auxílio ao suicídio.

Na ação, a Universidade Federal de Goiás, autarquia responsável pelo Hospital das Clínicas, argumentou que o estado do paciente era grave e pedia, com urgência, a transfusão de sangue. Explicou que o hospital é obrigado a respeitar o direito de autodeterminação da pessoa humana, reconhecido pela ordem jurídica, nada podendo fazer sem autorização da Justiça. Além disso, o hospital sustentou na ação que o direito à vida é um bem indisponível, cuja proteção incumbe ao Estado e que, no caso concreto, a transfusão sanguínea é a única forma de efetivação de tal direito.

Para o desembargador, Fagundes de Deus, “o direito à vida, porquanto o direito de nascer, crescer e prolongar a sua existência advém do próprio direito natural, inerente aos seres humanos, sendo este, sem sombra de dúvida, primário e antecedente a todos os demais direitos”. Com isso, autorizou a transfusão.

Por Geiza Martins
Fonte: Conjur

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Intangibilidade do salário e concretude da prestação jurisdicional

Como é cediço, a teor do que estampa o artigo 649, IV, do Código de Processo Civil, são absolutamente impenhoráveis os salários e toda a forma remuneratória a ele equiparada, assumindo relevo considerável os debates estabelecidos em torno do tema.

Apesar de haver previsão expressa em Lei, durante algum tempo a jurisprudência trilhou por caminho diverso, nomeadamente nos domínios da esfera trabalhista, na medida em que pacificou o entendimento sobre o qual a natureza salarial elencada no dispositivo ostentava a mesma essência daquela devida a trabalhadores em demandas trabalhistas.

Ocorre, todavia, que, modificando o sentido das cortes pretorianas e aplicando a literalidade contida no dispositivo legal mencionado, os Tribunais Regionais do Trabalho do país tem perfilhado entendimento diverso, arrimados pela Orientação Jurisprudencial 153, SBDI – 2, do Col. TST, que informa ofender direito líquido e certo o bloqueio de conta salário, ainda que limitado a qualquer percentual, porquanto a natureza do crédito trabalhista, segundo a OJ, não se confunde com aquela ostentada pela prestação alimentar.

Não se pode olvidar, diante disso, que o entendimento vai de encontro à efetividade da jurisdição, pois, como é de conhecimento geral, o número avassalador de execuções contraproducentes na justiça laboral deve-se nos mais das vezes às ações fraudulentas de empresas, que esvaziam o acervo patrimonial existente, no que são acompanhadas, em momento posterior e havendo abuso da personalidade jurídica, pelos sócios no conhecido estratagema do uso de “homens de palha” ou “laranjas” na composição societária, sendo certo que somente após a constrição salarial revela-se possível a consecução do fim maior do processo: a concretização do provimento jurisdicional.

A outro giro, impõe consignar que a entrega no provimento jurisdicional, muitas vezes pela interposição de recursos manifestamente procrastinatórios e tendo em conta a legislação retrógada, contribui para que demandas judiciais tenham seu “nascimento”, “crescimento”, “desenvolvimento” e “morte”, leia-se, fim, sem que seja oportunizada ao vencedor a satisfação do bem da vida pleiteado; no caso específico, créditos salariais, que ostentam natureza eminentemente alimentar.

É certo — e isso não se põe à prova de questionamento — que o Estado não possui interesse antagônico ao do vencedor de ação judicial, pelo contrário, é o maior interessado na satisfação integral da justiça, razão pela qual deve oferecer diretrizes materiais e legais para sua concretude.

Disso não se afasta a Emenda Constitucional 45/2004, que assegurou a todos os litigantes, seja em âmbito judicial ou administrativo, a duração razoável do processo, subsidiados por ferramentas que garantam a celeridade da tramitação processual e, como desdobramento lógico, a efetivação da tutela jurisdicional.

Nesse quadrante, releva consignar que referida disposição foi inserida não por acaso no rol de direitos fundamentais, já que o provimento jurisdicional é atividade inerente a qualquer Estado Democrático de Direito, sendo certo que os tribunais, fundamentalmente os superiores, devem desempenhar suas funções institucionais de modo a garantir o pleno exercício dos direitos previstos na Lex Legum, relativizando a letra fria da lei, se e quando em choque com os dogmas constitucionais.

Da mesma forma, não há falar-se que a constrição salarial represente ofensa à dignidade do trabalhador (ex-empresário), pois trabalhador dependente de salário também o é aquele que anos a fio se dedicou como funcionário para o acréscimo patrimonial da entidade e de seus componentes. Sob essa ótica, torna necessário que seja feito um paralelismo, a fim de garantir a materialização do princípio isonômico entre os litigantes perante as garantias irradiadas da relação jurídica, assinaladamente em razão da consonância que deve abarcar as normas que integram o texto da Lei Maior e, em especial, da inexistência de hierarquia entre o acervo das normas integrantes desse documento.

Nesse passo, forçoso concluir-se que a impenhorabilidade de salário prevista na Lei Instrumental não deve ser levada a efeito como premissa absoluta, ou, nos dizeres do TST, como direito líquido e certo, mas sim analisada em cada situação específica à luz do ordenamento constitucional vigente, máxime nas situações em que a sustentabilidade do executado não reste comprometida por essa medida excepcional, tantas vezes a última capaz de não frustrar a execução do crédito trabalhista.

Por Carlos Magno de Souza
Fonte: Direito e Justiça - Correio Brasiliense

domingo, 2 de maio de 2010

Comunidade jurídica debate duração de processo

Tempo no Judiciario - via crucis dos jurisdicionados
A duração razoável do processo e a jurisdição justa estão entre as maiores preocupações dos magistrados brasileiros. O assunto foi tema de um painel no XV Congresso Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, em Brasília, na quinta-feira (29/4). A Justiça do Trabalho, que atua em todo o país com 3.145 juízes em 1.378 varas, 24 tribunais regionais e um tribunal superior, decidiu mais de 2,9 milhões de processos em 2009 e foi o setor que mais se aproximou de cumprir a meta do Conselho Nacional de Justiça. Julgou 86% dos processos datados até 2005. A preocupação com as decisões em massa, que chegam a 400 ou 500 processos por sessão no TST, coloca em debate o direito à celeridade e os resultados administrativos.

O professor Willis Santiago, da UniRio, concorda que a duração razoável do processo, se for assegurada como um direito, seja um dos requisitos para se ter a jurisdição justa. Para ele, “o positivismo se mostrou nefasto devido ao seu tecnicismo e o excesso de formalismo. E o repensar das instituições jurídicas passa necessariamente por repensar objetivamente os valores humanos”.

Entretanto, o professor entende que estabelecer uma regra de duração para o processo não estará resolvendo o problema de Justiça. “Não se pode deixar de unir ao princípio da celeridade, o princípio da proporcionalidade para conferir justiça com paz social e certeza jurídica”. Para Willis Santiago, a proporcionalidade seria um ponto de equilíbrio entre o direito do trabalhador e o respeito à livre iniciativa. Esse ponto é a dignidade da pessoa humana, que deve prevalecer em qualquer situação de conflitos entre direitos. “Significa que em certas situações pode haver maior celeridade, mas também, em outros casos, pode haver necessidade de maior cuidado, um maior vagar na prestação da tutela jurisdicional”, disse.

40 anos de atraso
A procuradora-chefe da Procuradoria do Trabalho da 3ª Região, Elaine Nassif, acrescentou um dado preocupante. No Brasil, a discussão sobre a celeridade processual chega com 40 anos de atraso em relação aos Estados Unidos e a Europa. É um prejuízo, pois até mesmo países europeus que demoraram a instituir o processo célere, como a Itália, está pagando um alto preço, segundo ela.

Elaine Nassif lembrou que no Brasil a duração razoável do processo é um princípio que se baseia na administração por resultados e foi estabelecido pela Constituição Federal (EC 45) como forma de combater a morosidade da Justiça, na linha do excesso de formalismo processual. Mas, a defesa da celeridade, que só agora chega ao país, já é praticada nos Estados Unidos e na Europa, sendo prevista na Convenção Americana de Direito Humanos desde 1939 e na Convenção Européia dos Direito Humanos desde 1950. “Isso se explica pelo fato dessas convenções terem sido firmadas no pós-guerra e durante ditaduras no Brasil, que antes de adotar o modelo teve de primeiro assegurar o tribunal independente e as garantias à ampla defesa e ao contraditório”.

Na Europa, o princípio da duração razoável do processo se fortaleceu porque a corte de Strasburgo obrigou os países europeus a garantir a aplicação dos direitos previstos na Convenção de Direitos Humanos. Segundo a procuradora do Trabalho, a Itália foi condenada sucessivas vezes por descumprir a regra, até que em 1999 alterou sua Constituição para acrescentar o direito (artigo 111). Em 2001, aprovou a Lei “Michelli Pinto”, que prevê indenização decorrente de violação do artigo 6º da Convenção.

“É o inverso do que queremos aqui, onde primeiro se estuda o que fazer para racionalizar o processo e prestar uma jurisdição mais célere. Lá eles dizem que o direito a uma prestação célere implica o dever do estado de indenizar quem sofreu dano pela demora, não importando se a causa é complexa ou se a decisão seria justa”. De acordo com a procuradora, a Itália está sendo pressionada, porque está saindo mais caro uma Justiça lenta do que investir no Judiciário. O Estado italiano já pagou 41 milhões de euros e ainda deve 118 milhões de euros em indenizações. Com isso, novas leis estão surgindo para apressar as decisões, como a “calendarização”, onde o juiz recebe a ação e de imediato determina audiências, juntada de provas e determina como o processo vai se desenvolver.

Eficiência e rapidez
Elaine Nassif ressaltou que na Itália não existe uma definição do que seja duração razoável. O critério da razoabilidade é apenas um parâmetro para se avaliar a extensão temporal do processo. Esse critério se resolve na exigência de uma justiça tempestivamente administrada, portanto eficiente. Mas a eficiência não se prende na rapidez do juiz. Ela tenta aliar as garantias processuais com a administração da Justiça. São considerados itens como a complexidade da causa, o comportamento das partes e o comportamento do juiz e demais autoridades que colaboram nas decisões.

“Há uma clara diferença entre o que está acontecendo no Brasil e o que ocorre na Europa”, observa a procuradora do Trabalho. “Aqui a discussão envolve vários fatores onde se busca descobrir os motivos da lentidão, promove-se reformas e alterações diversas. Na Europa, eles são objetivos, se não resolveu em tempo hábil e o sujeito teve danos, a parte tem direito a indenização”.

Segundo Elaine Nassif, em julho de 2004, a suprema corte italiana afastou a responsabilização do juiz, promotor ou de qualquer autoridade, garantindo a reparação de danos caso haja desrespeito à duração razoável do processo. O Conselho Nacional da Magistratura italiana considerou que os juízes e servidores fazem parte de um conjunto responsável pelos resultados.

Teorias que não funcionam
José Aparecido dos Santos, juiz do Trabalho da 9ª Região, fez várias críticas ao modelo de instrumentalidade do processo judicial, problemas que para ele colocam em choque a duração razoável do processo e a possibilidade de uma decisão justa. Disse que o magistrado brasileiro é enxergado como um ser especial, capaz de decidir rapidamente e afirmar o que é justo. “Mesmo tendo em mãos um processo complexo, ao juiz basta ter a sensibilidade para aplicar uma justiça pré-existente, de preferência usando uma súmula do tribunal superior”, ironizou.

A teoria do contraditório e ampla defesa, onde as partes fazem alegações com igualdade e ao final o juiz escolhe o melhor argumento, também revela problemas. “A igualdade das partes se resume em ambas cumprirem um prazo para se manifestar, devendo atuar com procedimentos que são fixados em lei e não podem ser modificados pelo juiz”, argumentou. Para ele, “em vários casos o juiz vai precisar de mais tempo do que o previsto em lei, porque será injusto para o próprio princípio do contraditório, obter a justa decisão a partir dos prazos fixados em lei”.

Especificamente no processo trabalhista, José Aparecido dos Santos disse que os juízes são acusados de violar o procedimento e estariam sendo autoritários por adotar procedimentos não previstos em lei. “Isso é absolutamente impossível, porque o procedimento é sujeito a uma contínua interpretação, principalmente o trabalhista, que ele mescla regras do Código de Processo Civil e da CLT”. O problema, segundo Santos, é que “essas regras muitas vezes são incompatíveis, exigindo interpretações”.

Santos defendeu o processo coletivo e disse que é preciso pensar em soluções coletivas das demandas judiciais. “Nós precisamos pensar em novos papéis para o juiz e em novos papéis para o processo, que não tem mais sentido como um encaminhamento individual de demandas que se repetem continuamente a respeito do mesmo assunto”. Entretanto, ressaltou que não se trata de eleger legitimados para solucionar as questões, mas de instituir direitos coletivos e mecanismos coercitivos que evitem a repetição de demandas. “É vergonhoso que a grande parte das demandas no país sejam produzidas pelo Estado, pelas instituições financeiras e pelas empresas de telecomunicação”, disse. Para ele, casos repetidos como “as demandas sobre a conta do celular dependeriam muito mais de uma política pública vinculada à solução desses problemas. Portanto, devemos pensar também em políticas publicas que conduzam à diminuição das demandas judiciais”.

Qualidade em tempo
hábilEm outra sala do Congresso de Magistrados, os juízes do trabalho assistiam à palestra do ministro do STJ, Gilson Dipp, que é corregedor nacional da Justiça. Para Dipp, as políticas públicas implantadas no âmbito do Judiciário “fizeram com que o número de ações julgadas em tempo hábil aumentasse consideravelmente”. O ministro defendeu a celeridade como “um direito constitucional do cidadão”.

Gilson Dipp afirma que todas as políticas implantadas em conjunto pelo Conselho Nacional de Justiça e os tribunais foram importantes para reduzir demandas e aumentar a celeridade do processo. “Um marco divisor dessa política foi a Meta 2 do CNJ”, disse o ministro. “Não vejo que a celeridade implique em queda na qualidade das decisões, acho perfeitamente possível que o magistrado decida com qualidade e em tempo hábil”, afirmou. O ministro disse, ainda, que a Justiça Federal, incluindo a do Trabalho, proporcionam o aparato tecnicológico e humano para que haja decisões rápidas e de boa qualidade.

Por Eurico Batista
Fonte: Conjur

sábado, 1 de maio de 2010

Juiz ignora Supremo e decreta prescrição de pena

Ação sem futuro - gasto desnecessário
Condenado, em agosto de 1997, no processo 94.0040099-3, a quatro anos e seis meses de reclusão, pagamento de 50 dias-multa e a perda do cargo público, por uma tentativa de extorsão (concussão) em 1986, o delegado federal Edson Oliveira, 13 anos após a sentença, não ficou preso um dia sequer, jamais pagou um centavo da multa e permanece com a carteira e a pistola de delegado federal, recebendo mensalmente seu salário e presidindo inquéritos.

Em dezembro passado, a ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal, tentou dar um fim à impunidade que vinha sendo conquistada por meio de recursos protelatórios. Ela determinou, de forma clara, o imediato cumprimento da pena. Mas, no último dia 26, o juiz da 1ªVara Federal Criminal do Rio de Janeiro, Marcos André Bizzo Moliari, diferentemente do que entendeu a ministra do STF, concluiu pela prescrição da pena e decretou extinta a punibilidade com o arquivamento do processo.

Por esta decisão, o delegado federal cuja responsabilidade pelo crime denunciado foi reconhecida em todas as instâncias julgadoras pelas quais a Ação Penal tramitou, tornou-se um homem livre sem cumprir a pena que lhe foi dada pelo juiz de primeira instância, ampliada pelo TRF-2, mantida pelo STJ e confirmada pelo Supremo Tribunal Federal. Ele ainda acabará tendo direito à aposentadoria paga pelo erário já que tecnicamente é “inocente”, muito embora a Justiça o tenha considerado culpado.

Oliveira foi acusado por, em 1986, quando chefiava a o setor de Migração e Passaportes, ter conduzido “investigação informal” depois de descobrir que dois comissários da extinta Varig possuíam vultosas quantias depositadas em contas bancárias no exterior. Diante dos indícios da prática criminosa, o delegado deixou de formalizar a apuração do possível crime, fugindo ao dever do cargo, passando a demonstrar aos detentores da possível conta bancária que exigia parcela dos valores como contrapartida para não proceder à investigação formal.

Assim, segundo relatos retirados do processo, prosseguindo em seu intuito de obter vantagem indevida e servindo-se de sua condição de policial, ele foi à casa dos indiciados, bem como marcou almoço no restaurante Rios para discutir questões não oficiais e, ainda, levou os indiciados à sede da Polícia Federal. Lá, de modo ameaçador tomou declarações, sem qualquer respaldo formal. Tudo foi feito dentro das dependências da Superintendência da Polícia Federal passando a idéia de regularidade do ato.

Diante das intimidações, os “investigados” apresentaram queixa-crime junto à 14ª Delegacia de Polícia contra o delegado como incurso no artigo 148, do Código Penal – seqüestro e cárcere privado. Com a reação dos investigados e objetivando ocultar a sua conduta, Oliveira preparou um expediente, com data retroativa, dando ciência da “investigação” ao Coordenador Regional Policial. Por este documento foi denunciado por falsidade ideológica.

A polêmica criada no processo diz respeito à decisão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Rio e Espírito Santo) na apreciação do Recurso (Processo 97.02.46071-9 , clique aqui para ver - http://www.conjur.com.br/dl/edson-oliveira-acordao-trf2.pdf) em abril de 2002. A 6ª Turma do TRF-2, acompanhando o voto do relator, desembargador André Fontes, além de confirmar a pena pela concussão, aceitou o recurso do Ministério Público e condenou o réu também por falsidade ideológica. Mas a publicação do acórdão demorou dez meses e só ocorreu em fevereiro de 2003.

Desta decisão o réu impetrou Embargos de Declaração (21 de fevereiro de 2003),que só foram julgados dois anos depois, em fevereiro de 2005, quando foram rejeitados. Apresentou também Embargos Infringentes (11 de abril de 2005) também rejeitados, em setembro de 2005, na mesma sessão em que a Turma reconheceu a prescrição do crime de falsidade. O réu ainda apresentou novo recurso no TRF-2, em novembro de 2005, tão logo publicado o acórdão da decisão de setembro. A sessão que negou esta nova apelação do réu ocorreu oito meses depois dela ter sido protocolada, em junho de 2006. Houve ainda Recurso Extraordinário e Recurso Especial interpostos em julho, apreciados em setembro, cujas decisões – rejeitando o primeiro e acatando o segundo – só foram publicadas em fevereiro de 2007. Em março o caso finalmente foi para o Superior Tribunal de Justiça, nove anos e três meses depois de ter ingressado no TRF-2.

Em dois momentos, na tramitação do TRF, o Ministério Público chamou a atenção para a questão da prescrição. Ao se manifestar nos Embargos Infringentes, os procuradores alertaram para o risco da prescrição, como relata o voto do desembargador André Fontes. Depois, na manifestação sobre os Recursos Especial e Extraordinário, em agosto de 2006, a Procuradoria da República defendeu a expedição da Carta de Execução Provisória da Sentença, o que lhe foi negado porque o processo ainda “não tinha transitado em julgado”.

No STJ as decisões do TRF não sofreram nenhuma modificação. A defesa do delegado resolveu recorrer ao Supremo Tribunal Federal onde deram entrada em nada menos do que três Habeas Corpus e um Agravo de Instrumento entre os meses de junho e dezembro de 2009. O primeiro foi justamente pela recusa do STJ em receber o Recurso Especial. O STF rejeitou o HC explicando não competir “ao Supremo Tribunal Federal reapreciar os requisitos de admissibilidade do recurso especial e proceder ao julgamento do mérito" da mesma forma como recusou discutir, por meio de HC, a dosimetria da pena aplicada anteriormente: “não há nulidade na decisão que majora a pena-base e fixa o regime inicial mais gravoso, considerando-se as circunstâncias judiciais desfavoráveis, não servindo o Habeas Corpus como instrumento idôneo para realizar a ponderação, em concreto, das circunstâncias judiciais do art. 59, do Código Penal”.

As novas tentativas da defesa foram no sentido de buscar a prescrição da pena aplicada pela concussão, mas não obtiveram êxito, pois a relatora do caso, ministra Ellen Gracie entendeu que o prazo prescricional iniciara-se com a modificação da sentença pelo TRF. Ela deixou claro ao apreciar o Agravo de Instrumento 759.450 (clique aqui para ver a decisão - jur.com.br/dl/edson-oliveira-ai-stf-ellen-grac.pdf) que o acórdão condenatório do TRF "qualifica-se como causa de interrupção da prescrição penal, posto que equiparado, para tal fim, à sentença condenatória recorrível", tal e qual já decidira o Supremo no Habeas Corpus 70.810, relatado pelo ministro Celso de Mello.

Baseado nesta jurisprudência ela bateu firme contra o uso de recursos para não se fazer Justiça e determinou que, antes mesmo do acórdão publicado, a sentença começasse a ser cumprida, nos mesmos moldes de uma decisão anterior do ministro Eros Graus em um Recurso em Mandado de Segurança (RMS 23.841).

Na decisão, ela foi clara e direta: “Considero que a utilização indevida das espécies recursais, consubstanciada na interposição de inúmeros recursos contrários à jurisprudência como mero expediente protelatório, desvirtua o próprio postulado constitucional da ampla defesa. Nesse sentido: Ação Originária 1.046-ED/RR, relator ministro Joaquim Barbosa”.

Prosseguiu em seu despacho: ”parece-me claro que, no presente feito, o ora embargante tenta, a todo custo, protelar a baixa dos autos, o que representará o início do dever de cumprimento da pena que lhe foi imposta. A interposição de embargos de declaração com finalidade meramente protelatória autoriza o imediato cumprimento da decisão emanada pelo Supremo Tribunal Federal, independentemente da publicação do acórdão”.

A ementa da decisão da 2ª Turma do Supremo “à unanimidade, rejeitou os embargos de declaração e determinou a imediata baixa dos autos para execução, nos termos do voto da Relatora”.

Mas o juiz da 1ª Vara Federal, depois que o Ministério Público requisitou o início do cumprimento da pena, teve entendimento oposto ao da ministra do Supremo Tribunal Federal (veja em anexo a decisão - http://www.conjur.com.br/dl/edson-oliveira-prescricao-vara-f.pdf). Para Bizzo Moliari “o acórdão que confirmou a condenação do sentenciado não é causa interruptiva da prescrição, prevista no artigo 117 do Código Penal, conforme vêm entendendo a nossa hodierna jurisprudência: Acórdão confirmatório da sentença condenatória - Não interrompe a prescrição, uma vez que a hipótese não se encontra prevista no art. 117, que contém enumeração taxativa, não podendo ser ampliada. Enquanto no caso da pronúncia o Código Penal prevê sua confirmação como causa interruptiva, silencia a respeito do acórdão confirmatório da sentença condenatória. Por isso, não podendo o texto ser estendido, a prescrição da pretensão punitiva não encontra obstáculo quando a decisão de primeiro grau vem a ser confirmada na instância superior”, escreveu em sua decisão publicada na segunda-feira 26 de abril.

Em seguida, ele concluiu: “a prescrição da pretensão punitiva estatal para o caso em foco se opera em 12 (doze) anos, por força do disposto no inciso III do art. 109 c/c § 1º e 2° do artigo 110 ambos do Código Penal. Como se pode aferir, entre a data da publicação da sentença condenatória em 15.08.1997, que foi o último marco interruptivo, e a data do trânsito em julgado definitivo ocorrido em 07.01.2010 , transcorreu um lapso temporal que extrapola o limite prescricional de 12 (doze) anos, nos termos do art. 109, III do Código Penal, sem que se tenha dado início ao cumprimento da pena”.

A extinção da punibilidade decretada pelo juízo será motivo de recurso por parte da procuradora Lilian Guilhon Doré, a mesma que pediu a execução da sentença entendendo que não ocorreu prescrição.

Jogo do bicho
Edson Oliveira tem ainda outra condenação na 2ªVara Federal Criminal do Rio de Janeiro por corrupção. Ele é acusado de receber dinheiro do jogo do bicho, conforme registro na contabilidade do Castor de Andrade descoberta em 1994 pelo Antônio Carlos Biscaia, então procurador de Justiça do Rio. Nesse caso, ele foi condenado a 3 aos e 6 meses de prisão.
Esta condenação ele também não cumpriu, pois — como informou a revista Consultor Jurídico — o STJ, informou ao TRF-2, por telex, que o processo tinha sido trancado quando, na verdade, ele foi trancado apenas para o crime de formação de quadrilha, já que o juiz não acatou a denúncia para esse delito.

Por ordem do ministro Paulo Galotti, do STJ, o equívoco foi sanado e o TRF-2 recebeu a ordem para julgar recurso do MP pedindo o aumento de pena e do delegado pedindo a absolvição. Este caso também corre o risco de prescrever sem que ele cumpra a pena a que foi condenado.

Fonte: Conjur