sábado, 22 de maio de 2010

SOBRE O ENSINO JURÍDICO NOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA

Outra realidade
Contribuição enviada por Ludmila Oliveira e Tarcísio Magalhães,estudantes do 7º período da Faculdade de Direito da UFMG, intercambistas na University of Wisconsin-Madison.

Em julho de 2008, recebemos a notícia de que havíamos sido aprovados no Programa de Mobilidade Discente Internacional do Departamento de Relações Internacionais da Universidade Federal de Minas Gerais para cursar o segundo semestre de 2009 na University of Wisconsin-Madison, nos Estados Unidos da América. Ficamos extremamente felizes, mas, ao mesmo tempo, receosos de como seria estudar em uma universidade em outro país, cujo sistema jurídico é tão diverso do nosso. Por se tratar de um país adepto do Common Law, optamos por cursar disciplinas relacionadas ao Direito Internacional, além de Direito Americano.

O meio acadêmico nos Estados Unidos é extremamente diferente do brasileiro: a faculdade, os professores, os alunos, o estilo das aulas, as formas de ensino e aprendizado, os métodos avaliativos e por aí em diante…

Vejamos:
Primeiramente, vale ressaltar que o curso de Direito é uma pós-graduação (chamada de graduation). Em outras palavras, é necessário ter um diploma de um curso de 4 anos (undergraduation) para ingressar na faculdade de Direito. O curso de Direito dura, em média, 3 anos e, a partir do 2 ano, a grade curricular é montada pelo próprio aluno.

Os professores—que, quase à unanimidade, não desempenham outra atividade que não a do magistério—, sempre enviam, alguns dias antes do início das aulas, e-mails, para todos os alunos matriculados na disciplina, com o cronograma do curso (o syllabus), contendo todas as tarefas e leituras referentes a cada aula do semestre. É obrigatório que todos os alunos leiam todo o material indicado para cada dia de aula; uma leitura bastante extensa, incluindo, muitas vezes, vários capítulos de um livro. O syllabus contem tarefas, inclusive, para o primeiro dia de aula. Por isso, uma semana antes das aulas começarem, a biblioteca fica repleta de alunos cumprindo suas respectivas tarefas agendadas para o primeiro dia.

O material didático é composto de Casebooks, isto é, livros com pouca explicação da matéria e muitos casos. O alunos aprendem sempre com base em casos, pois o ensino jurídico americano é muito voltado para o caso concreto e o Direito na prática.

O ensino nas faculdades de Direito norte-americanas se baseia no método socrático, ou seja, os professores tendem a responder às perguntas dos alunos sempre com outra pergunta, estimulando a discussão e o debate, de modo a construírem, professor e aluno, o conhecimento juntos. Diz-se que, nas salas de aula americanas, o professor e os alunos se encontram em pé de igualdade, ambos buscando aprender. Os alunos são constantemente incentivados a questionarem e a participação é sempre considerada na hora da pontuação. Logo, as aulas de Direito nunca são expositivas, mas sempre discursivas. O professor ministra sua aula dirigindo perguntas aos alunos, as quais devem ser respondidas com base na leitura prévia. Por essa razão, as turmas são, em sua maioria, bem reduzidas (cursamos uma matéria, por exemplo, na qual somente 10 pessoas estavam matriculados).

Outra discrepância com o nosso sistema são os métodos avaliativos. Em primeiro lugar, as notas são dadas quase sempre em curva. Isso significa que a nota de cada aluno é atribuída em comparação com a do colega. Via de regra, somente 10% da classe pode obter conceito A, 25% B, 35% C, 30% D, alguns poucos sendo reprovados. Tal sistema proporciona uma forte competição entre os alunos. Cada um estuda com seus próprios materiais e ninguém empresta anotações, resumos ou similares, vez que, se um aluno ajudar o outro, estará se prejudicando. Por fim, os alunos recebem suas notas contendo a posição na qual eles se encontram perante o restante da turma, ou seja, suas colocações em um ranking de melhores alunos. Isto é de extrema importância para os alunos de Direto, pois os grandes escritórios valorizam boas notas e contratam apenas os mais bem conceituados.

Os professores tem total liberdade para escolher como os pontos do semestre serão distribuídos. Alguns optam pela elaboração de artigos, outros mesclam artigos e provas escritas e ainda tem aqueles que decidem aplicar somente uma prova ao final do semestre. Em função do próprio sistema jurídico norte-americano, os professores não levam em conta, na hora da avaliação, se o aluno decorou cada trecho do livro ou se gravou cada palavra dita em sala de aula. O relevante é que as respostas às questões nas provas e o raciocínio apresentado nos artigos sejam capazes de convencer o professor. O que se busca desenvolver e aperfeiçoar é sempre a persuasão. Os alunos de Direito estadunidenses são treinados a ganharem casos, o que é feito provando ser seu argumento o melhor e destruindo o argumento adversário.

Finalmente, um aspecto que nos marcou é a estrutura fornecida pela universidade, principalmente para pesquisa. Existem 56 bibliotecas no campus, sendo muitas delas 24 horas. As bibliotecas são equipadas com máquinas de xerox e scanners, cafeteria, computadores, máquinas de refrigerante e salgadinhos, sofás... Enfim, tudo o que o aluno possa precisar. Além do vastíssimo banco de dados da própria universidade (para se ter uma idéia, é possível ler a Folha de São Paulo através do site da biblioteca, dentre outros milhares de jornais, revistas e artigos de toda parte do globo), existe ainda um convênio celebrado entre a University of Wisconsin-Madison e diversas outras universidades do mundo (inclusive a USP), por meio do qual o aluno pode encomendar, via internet, um livro que se encontra em outra biblioteca (no Brasil, na Europa, etc.) sem qualquer custo adicional. Ademais, não há limite máximo de livros por aluno e as bibliotecas emprestam, além de livros, é claro, DVDs, jogos de video game e, até mesmo, notebooks e carregadores, tudo com a simples apresentação da carteira da biblioteca. Por último, existem equipes espalhadas pelo campus para auxiliar os alunos na elaboração de artigos e resolução de exercícios, corrigindo e dando dicas.

Esperamos que as informações tenham ajudado àqueles que queiram embarcar nessa aventura do intercâmbio acadêmico internacional. Nos colocamos à disposição para responder eventuais dúvidas sobre moradia, visto, passagem, gastos etc., e, obviamente, sobre o sistema de ensino norte-americano. Basta entrar em contato!

Fonte: Blog Magistério Jurídico

4 comentários:

  1. Muito interessante seu texto.

    Quem dera as Universidades de Direito do Brasil fossem 1/3 de uma dessas.

    Abraços!

    P.S.: Tomei a liberdade de reproduzir seu texto em meu blog:videdireito.blogspot.com.

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  2. Valeu Marcia! E parabéns pelo blog. Abraços!

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  3. seria ótimo que a gente tivesse professores que não se contaminassem com a corja dos advogados, nem com promotores de justiça e nem juízes.

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  4. É bem interessante, sim...seria ótimo ter algo parecido aqui no Brasil ou, mais especificamente, na Paraíba...só não sei, até que ponto, é interessante haver essa competitividade exacerbada, bem como a falta de coleguismo e troca de informações. Afinal, a troca de informações é sempre importante para o crescimento pessoal e em grupo!
    Valeu pelas informações!

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