quarta-feira, 3 de novembro de 2010

V Semana Acadêmica de Direito "Direito e Políticas Criminais" - FACISA

Respondendo as perguntas - promessa cumprida
Campina Grande de 25 a 28 de outubro de 2010

Perguntas encaminhadas à mesa, durante a palestra com o tema: Execução Penal e novas práticas

1º. Pergunta (o participante não colocou o nome) – Não corremos o risco de estigmatizar o apenado com o uso de tornozeleira no meio social, trazendo-lhe uma “sanção” não prevista em lei, impondo-lhe uma outra pena e, ainda, possibilitando que o mesmo pratique outros crimes?
Resposta (Prof. Bruno Azevedo) – Não acredito que o uso da tornozeleira vá trazer qualquer estigma ao preso. Achar que a pena que ele responde ou a sua passagem pelo sistema carcerário não o traz já este estigma é uma falácia. Todos do seu convívio social já sabem a sua condição. O fato de ser apenado o um ex-detento é notório, e isso já o rotula. Pensando em diminuir essa imagem, quando desenvolvemos o monitoramento eletrônico de presos, fizemos a opção pelo modelo tornozeleira, pois tinha a opção de ficar sob a calça. E assim, diminuiríamos as percepções negativas. Tenho que a tornozeleira representa algo bem menor em termos de eventuais prejuízos a imagem do preso, do que o fato de ficar encarcerado, se recolhendo todos os dias perante uma unidade prisional. Quanto a questão normativa. Hoje já existe lei prevendo a sua utilização. Desde junho. E o texto final do Novo Código de Processo Penal que foi apresentado ao Senado, vem constando a hipótese do Monitoramento Eletrônico de Presos e uma total reformulação da prisão domiciliar no nosso País. O uso da tornozeleira não impedirá o cometimento de novos crimes. Porém, se assim o fizer a pessoa que a estiver utilizando será encontrada em tempo real. Pois, saberemos que aquela pessoa estava na cena do crime. Se o aparelho for retirado, em tempo real nós saberemos. E aí, essa pessoa imediatamente será considerada foragida, podendo a Polícia ser acionada a partir daquele último ponto onde a tornozeleira foi removida. Claro que nem todos apenados poderão usar a tornozeleira. Ficará a critério do juiz no caso concreto decidir.

2º. Pergunta (também anônima) – Professor, segundo a sua linha de raciocínio, eu poderia entender que com a implementação das tornozeleiras se extinguirá a prisão provisória de qualquer espécie. Entretanto, isto poderia se aplicar a prisão domiciliar em caso de um assassino ou um traficante? Não seria um risco muito alto deixar uma pessoa que representa tamanho perigo sendo observado apenas por um sinal de localização e um baixo senso moral do apenado?

Resposta (Professor Bruno): A idéia não é extinguir as hipóteses de prisão cautelar. Se passei essa idéia fui falho na explanação. O que quis dizer foi que podemos minimizar a cultura do “teje preso”. Hoje, o que vigora perante o sistema jurídico é essa cultura. Tanto que mais de 40% dos presos do sistema carcerário são de presos provisórios. Todos misturados com o grosso da massa carcerária, sem divisão alguma e ocupando uma vaga, que em tese, deveria ser destinada a presos definitivos. Por isso que já somos a 3o. maior população carcerária do mundo com cerca de 500.000 presos e mais de outro tanto de mandados de prisões a cumprir. Muitas dessa prisões de natureza cautelar poderiam ser evitadas. Não esqueçamos que a regra é responde a uma ação penal em liberdade. Mas, como em regra o Direito Penal só alcança os excluídos, não tem ninguém que peça por eles. E aí, amargam uma prisão cautelar que acaba se protraindo no tempo e servindo como antecipação de pena. Por isso que inventamos a idéia da PROGRESSÃO VIRTUAL DA PENA. A questão de quem vai utilizar a tornozeleira, ficará a depender na análise do juiz, no caso concreto. Se o sujeito é merecedor ou não dessa oportunidade. Em muitas dessas prisões de natureza cautelar, o sujeito poderia ficar sendo monitorado. Ele continuaria com a sua vida normalmente, com seu trabalho, no seio de sua família, as suas expenças...Poderíamos, a depender do caso, até conjugar o monitoramento com a prisão domiciliar. Foi essa a nossa idéia quando encaminhamos propostas a Comissão de Reforma do Código de Processo Penal. E veio constando na redação final, encaminhada ao Senado.

3º. Pergunta – (encaminhada por Ramilson) O uso da Tornozeleira Eletrônica não poderia ser considerada constrangimento ao apenado ou motivo de discriminação por parte da população?
Resposta (Professor Bruno): Creio que já abordei a questão nas respostas anteriores. Mas, vamos tentar clarear mais um pouco. Como falei, é uma grande falácia acreditar que o preso já não é rotulado. Pois, todos de sua convivência já sabe da sua condição. E até que ele se afaste das suas pessoas, quando o mesmo for procurar um emprego, vai ter que juntas a sua Certidão de Antecedentes Criminais. A não ser, que também deseje ficar na informalidade pelo resta da vida. Claro que ninguém pensa nisso, porque o Estado renunciou a sua missão de reinserção social. O Estado só pensa em punir, tracafiar e se possível o mais longe da cidade de cada um de nós. Não há políticas de recuperação do preso. De se tentar aproveita a mão de obra, de dá uma ocupação, uma profissão digna. Tenho que utilizar uma tornozeleira, seja algo bem menos agressivo do que ficar confinado em meio ao grosso da massa carcerária, sem atividade alguma, suportando todos os males do sistema prisional. Sem falar a enorme economia para o Estado. Um preso custa em média R$ 1800,00. Criar uma vaga em um sistema de porte médio, como o do nosso Estado, custa em média R$ 35.000,00. Enquanto uma tornozeleira custa cerca de R$ 400,00.

4º. Pergunta – (encaminhada por Frederico Figueiredo) Considerando sua visão de magistrado progressista, o que se verifica pela sua atuação à frente da 1ª. Vara de Guarabira, gostaria de saber sua opinião sobre o Projeto de Lei aprovado no dia 30 de junho de 2010, o qual obriga os juízes a redigir suas sentenças em linguagem coloquial, sempre que uma das partes for pessoa física?

Resposta (Professor Bruno): A idéia é se aproximar ainda mais do povo, diminuindo o uso do “juridiquês”. A Associação do Magistrados do Brasil – AMB, há cerca de 03 anos fez uma grande campanha para que todos os envolvidos na seara jurídica utilizem uma linguagem comum. Não raro, quando vemos pessoas alheias, “voando”, quando participam de uma audiência. Não sabem se houve condenação ou absolvição. Lembremos que o intuito é também aumentar o controle dos atos de todos que atuam no processo por parte de qualquer pessoa.
5º. Pergunta (o autor também preferiu não se identificar) – Assisti um documentário em relação ao sistema carcerário do Japão. Um condenado neste país, quando cumpre sua pena, ele sai honrado, é visto pela população como uma pessoa que realmente cumpriu o que devia. No Brasil, nossa cultura afirma e confirma que um ex-preso sempre será bandido. Então não teríamos também que mudar o conceito cultural da nossa sociedade ou relação ao acolhimento destes ex-encarcerados?

Resposta (Professor Bruno): No nosso caso, como falei há pouco, o Estado renunciou a qualquer política de reinserção social. E essa omissão tem gerado os descalabros e desventuras do sistema prisional. O ideal era desenvolver atividades profissionais, qualificar quem está cumprindo pena, incluí-lo em alguma atividade laborativa, para que aquela pessoa tenha mais oportunidades de sucesso em ser aproveitada, quando deixar o cárcere. Hoje, o sistema prisional é visto como uma carta fora do baralho pelo modelo econômico excludente que vivemos. Por isso os altos índices de reincidência, de aliciamento para continuar a servir em outras trincheiras que não interessam a paz social.

6º. Pergunta (sem identificação) – Porque outro juízes não se espelham em suas atividades, e o que os impedem de implantarem esse projetos em vez de viverem na inércia, seguindo um modelo arcaico de Justiça. Sem inovarem?

Resposta (Professor Bruno): Agradeço a pergunta e elogios. Mas, hoje já existe uma nova mentalidade perante o Judiciário. Os juízes têm uma carga enorme de trabalho. E se esmeram para responder os anseios da sociedade, através da solução ao caso concreto. Hoje, o CNJ tem estimulado novas práticas, criando até mesmo um prêmio, o INNOVARE. Agora, sob a regência de um instituto próprio, o Instituto Innovare. Também tem o Prêmio Conciliar é Legal. Além disso, o CNJ tem procurado estabelecer metas que façam com que o Judiciário busque mais essa postura proativa. E os novos tempos exigem essa mudança de mentalidade. Não dá mais para ficar totalmente inerte, alheio a dá uma contribuição social aos problemas que afligem a nossa sociedade. Podemos um pouco mais. Procuro trazer a experiência e teoria da Universidade, da academia para apontar soluções para os problemas. Na academia foi essencial o mergulho no Direito Constitucional. Além disso, tenho procurado me espelhar naqueles juízes que me servem de inspiração, de me lembrar das boas lições dos meus professores e da “mobilidade” que aprendi, quando fui Presidente do Centro Acadêmico Sobral Pinto na Faculdade de Direito de Campina Grande. Aqui foi minha grande escola. Essa passagem pelo “Poder Executivo” foi determinante para o meu perfil de magistrado. Ganhei Know-how para pensar, desenvolver e executar projetos, trabalhando sempre em equipe. O movimento estudantil, onde fui cara pintada, foi uma grande escola.
Obs.: como não tive tempo de responder no evento realizado, as perguntas encaminhadas, prometi que responderia no blog. Missão cumprida.

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