Realidade de hoje
Sem dúvida, há desencontro entre a opinião pública e o direito vigente no país acerca do tema da maioridade penal. É o que se infere diante de pesquisas de opinião: em dezembro/2003, o CNT/Sensus indicava o percentual de 88,1%, enquanto a Folha de S. Paulo, janeiro/2004, apontava 84% dos entrevistados que se manifestaram favoráveis à redução da maioridade.
A Constituição Federal, art. 228, o Código Penal, art. 27, e o Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 104, asseguram a maioridade penal somente aos 18 anos, enquanto lei mais recente, o Código Civil de 2002 reduziu para 16 anos a maioridade civil; a lei eleitoral e a própria Constituição asseguraram a maioridade política a partir dos 16 anos, ao permitir aos jovens nessa idade escolher os governantes.
O primeiro Código Penal brasileiro, o Código Imperial de 1830, fixava a maioridade penal em 14 anos; o advento da República provocou a edição do Código Penal dos Estados Unidos do Brasil, mediante o Decreto nº 847, de 11/10/1890, que estabelecia não serem criminosos “os menores de 9 anos completos;” e “os maiores de 9 anos e menores de 14, que obrarem sem discernimento”. O Código de Menores de 12/10/1927, Decreto n° 17.943-A, conhecido por Código Mello Matos, assegurava inimputabilidade para o infrator que tivesse até 14 anos; acima dessa idade e menos de 18 anos aplicavam-se as disposições da nova lei, utilizando-se o critério biopsicológico.
O Código de 1940, na exposição de motivos, esclarecia que “não cuida o projeto dos imaturos (menores de 18 anos) senão para declará-los inteira e irrestritamente fora do direito penal (art. 23), sujeitos apenas à pedagogia corretiva da legislação especial”.
O Código de Menores, Lei nº 6.697, de 10/10/1979, assim como as outras leis sobre o assunto, seguiram o mesmo caminho, para considerar inimputável o menor de 18 anos. Essa lei, denominada de Estatuto da Criança e do Adolescente, estabelece que o fato de um adolescente furtar, traficar, ou matar não implica em crime, mas numa infração; sustenta-se no argumento de que os “infantes” não sabem o que fazem ou não têm maturidade, e, portanto, são inimputáveis.
A reforma ao Código Penal, de 1984, manteve a inimputabilidade penal aos 18 anos, inadmitindo o critério biopsicológico e aderindo ao sistema biológico. A Constituição de 1988 ratificou a maioridade somente aos 18 anos.
O adulto ou o adolescente que mata uma pessoa comete um crime ou uma infração, mas tanto um quanto o outro acabam com a vida de um ser humano. O maior e o menor de 18 anos serão julgados por leis diferentes; enquanto o Código Penal aprecia a gravidade do delito e aplica a pena contra o criminoso, o Estatuto da Criança e do Adolescente, sob o argumento de reabilitação do menor, desconsidera a gravidade da infração e apenas admite o internamento do menor. Assim, o Código Penal trata o adulto de homicida e a Lei n. 8.069/90 considera o adolescente apenas um mal educado; um vai para a cadeia, outro será internado em estabelecimento educacional. Em outras palavras, o sistema em vigor separa o anjo, adolescente com 17 anos e 11 meses e 29 dias, do demônio, adulto com mais de 18 anos.
As leis que fixam a responsabilidade penal alicerçam-se no critério biológico, ou seja, privilegiam a idade, desconsiderando a capacidade física e psíquica do infrator que recebe da Vara da Infância e da Juventude, se condenado, uma das seguintes “penas”: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semiliberdade ou internação em estabelecimento educacional, a exemplo da Febem; mas uma dessas “medidas socioeducativas” não pode durar mais de três anos, e o menor nunca será levado ao sistema penitenciário. A criança de até 12 anos simplesmente não pode ser punido pelo Estado.
Grande é o número de adolescentes envolvidos na prática de crimes hediondos, como homicídio qualificado, tráfico de entorpecentes, estupro, latrocínio. Assim, o menor de 18 e maior de 16 anos têm de ser considerado cidadãos com capacidade para entender as consequências de seus atos, porque possui discernimento e compreensão de que essas ações são ilícitas e merecedoras de penas.
A presunção que se tinha, em 1940, edição do Código Penal, de ingenuidade, de falta de entendimento da ilicitude da conduta, já não encontra eco nos dias atuais, pois, em meados do século passado, o Brasil era eminentemente agrário, diferentemente do que ocorre atualmente, quando o acesso à informação, à educação ampliou-se consideravelmente. Os tempos mudaram, as informações tornaram-se mais fáceis e acessíveis a um maior número de pessoas e as fontes de estudo expandiram-se. Afinal, nestes últimos 60 anos o Brasil e o mundo passaram por significativas transformações sociais.
A consciência política, quando se confere ao menor de 18 anos o direito de escolher seus governantes, deve coincidir com a consciência penal. A Constituição Federal, art. 14, § 1º, inc. II, alínea “c”, e o Código Eleitoral consignam o direito de o menor de 18 anos escolher seus governantes. E o Código Civil, editado em 2002, reduziu a maioridade civil de 21 para 18 anos de idade, permitindo que o cidadão, com 16 anos, possa constituir empresa, assumir obrigações fiscais e trabalhistas; com tudo isso, a responsabilidade penal não é fixada aos 16 anos, sob o argumento de que o adolescente não tem maturidade para entender que matar, roubar, estuprar são procedimentos errados e, assim, os jovens que se envolvem nessas práticas não merecem penas.
A OAB e outros segmentos da sociedade que não admitem a redução da idade penal explicam que o jovem, autor de infrações, “crimes” quando envolve os maiores, não será reeducado se encarcerado juntamente com os criminosos de maior idade. Esse argumento é falacioso, porquanto tanto as cadeias quanto as instituições socioeducativas são verdadeiras “escolas do crime” e não se prestam para punir os adultos e muito menos os adolescentes. Não se pode deixar de reduzir a idade penal sob o motivo de que a redução complicará ainda mais a situação crítica dos presídios.
Compete ao Estado envidar esforços para transformar os presídios e as Feben’s ou alterar os meios de punição para os criminosos; o cidadão é que não pode nem deve continuar sofrendo violência, originada de jovens, cientes de que não serão punidos. O menor pode cometer o crime mais bárbaro possível que receberá como “pena” o cumprimento de medida socioeducativa, mesmo assim por três anos e, quando completar 21 anos, será posto em liberdade com a ficha limpa; se praticar outro crime não será reincidente, mas réu primário.
Os legisladores não devem esperar o cometimento de outros crimes bárbaros pelos menores para fazer tramitar as várias emendas à Constituição, objetivando alteração do art. 228 da Constituição Federal.
Por Antonio Pessoa Cardoso
Fonte: Direito & Justiça
A Constituição Federal, art. 228, o Código Penal, art. 27, e o Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 104, asseguram a maioridade penal somente aos 18 anos, enquanto lei mais recente, o Código Civil de 2002 reduziu para 16 anos a maioridade civil; a lei eleitoral e a própria Constituição asseguraram a maioridade política a partir dos 16 anos, ao permitir aos jovens nessa idade escolher os governantes.
O primeiro Código Penal brasileiro, o Código Imperial de 1830, fixava a maioridade penal em 14 anos; o advento da República provocou a edição do Código Penal dos Estados Unidos do Brasil, mediante o Decreto nº 847, de 11/10/1890, que estabelecia não serem criminosos “os menores de 9 anos completos;” e “os maiores de 9 anos e menores de 14, que obrarem sem discernimento”. O Código de Menores de 12/10/1927, Decreto n° 17.943-A, conhecido por Código Mello Matos, assegurava inimputabilidade para o infrator que tivesse até 14 anos; acima dessa idade e menos de 18 anos aplicavam-se as disposições da nova lei, utilizando-se o critério biopsicológico.
O Código de 1940, na exposição de motivos, esclarecia que “não cuida o projeto dos imaturos (menores de 18 anos) senão para declará-los inteira e irrestritamente fora do direito penal (art. 23), sujeitos apenas à pedagogia corretiva da legislação especial”.
O Código de Menores, Lei nº 6.697, de 10/10/1979, assim como as outras leis sobre o assunto, seguiram o mesmo caminho, para considerar inimputável o menor de 18 anos. Essa lei, denominada de Estatuto da Criança e do Adolescente, estabelece que o fato de um adolescente furtar, traficar, ou matar não implica em crime, mas numa infração; sustenta-se no argumento de que os “infantes” não sabem o que fazem ou não têm maturidade, e, portanto, são inimputáveis.
A reforma ao Código Penal, de 1984, manteve a inimputabilidade penal aos 18 anos, inadmitindo o critério biopsicológico e aderindo ao sistema biológico. A Constituição de 1988 ratificou a maioridade somente aos 18 anos.
O adulto ou o adolescente que mata uma pessoa comete um crime ou uma infração, mas tanto um quanto o outro acabam com a vida de um ser humano. O maior e o menor de 18 anos serão julgados por leis diferentes; enquanto o Código Penal aprecia a gravidade do delito e aplica a pena contra o criminoso, o Estatuto da Criança e do Adolescente, sob o argumento de reabilitação do menor, desconsidera a gravidade da infração e apenas admite o internamento do menor. Assim, o Código Penal trata o adulto de homicida e a Lei n. 8.069/90 considera o adolescente apenas um mal educado; um vai para a cadeia, outro será internado em estabelecimento educacional. Em outras palavras, o sistema em vigor separa o anjo, adolescente com 17 anos e 11 meses e 29 dias, do demônio, adulto com mais de 18 anos.
As leis que fixam a responsabilidade penal alicerçam-se no critério biológico, ou seja, privilegiam a idade, desconsiderando a capacidade física e psíquica do infrator que recebe da Vara da Infância e da Juventude, se condenado, uma das seguintes “penas”: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semiliberdade ou internação em estabelecimento educacional, a exemplo da Febem; mas uma dessas “medidas socioeducativas” não pode durar mais de três anos, e o menor nunca será levado ao sistema penitenciário. A criança de até 12 anos simplesmente não pode ser punido pelo Estado.
Grande é o número de adolescentes envolvidos na prática de crimes hediondos, como homicídio qualificado, tráfico de entorpecentes, estupro, latrocínio. Assim, o menor de 18 e maior de 16 anos têm de ser considerado cidadãos com capacidade para entender as consequências de seus atos, porque possui discernimento e compreensão de que essas ações são ilícitas e merecedoras de penas.
A presunção que se tinha, em 1940, edição do Código Penal, de ingenuidade, de falta de entendimento da ilicitude da conduta, já não encontra eco nos dias atuais, pois, em meados do século passado, o Brasil era eminentemente agrário, diferentemente do que ocorre atualmente, quando o acesso à informação, à educação ampliou-se consideravelmente. Os tempos mudaram, as informações tornaram-se mais fáceis e acessíveis a um maior número de pessoas e as fontes de estudo expandiram-se. Afinal, nestes últimos 60 anos o Brasil e o mundo passaram por significativas transformações sociais.
A consciência política, quando se confere ao menor de 18 anos o direito de escolher seus governantes, deve coincidir com a consciência penal. A Constituição Federal, art. 14, § 1º, inc. II, alínea “c”, e o Código Eleitoral consignam o direito de o menor de 18 anos escolher seus governantes. E o Código Civil, editado em 2002, reduziu a maioridade civil de 21 para 18 anos de idade, permitindo que o cidadão, com 16 anos, possa constituir empresa, assumir obrigações fiscais e trabalhistas; com tudo isso, a responsabilidade penal não é fixada aos 16 anos, sob o argumento de que o adolescente não tem maturidade para entender que matar, roubar, estuprar são procedimentos errados e, assim, os jovens que se envolvem nessas práticas não merecem penas.
A OAB e outros segmentos da sociedade que não admitem a redução da idade penal explicam que o jovem, autor de infrações, “crimes” quando envolve os maiores, não será reeducado se encarcerado juntamente com os criminosos de maior idade. Esse argumento é falacioso, porquanto tanto as cadeias quanto as instituições socioeducativas são verdadeiras “escolas do crime” e não se prestam para punir os adultos e muito menos os adolescentes. Não se pode deixar de reduzir a idade penal sob o motivo de que a redução complicará ainda mais a situação crítica dos presídios.
Compete ao Estado envidar esforços para transformar os presídios e as Feben’s ou alterar os meios de punição para os criminosos; o cidadão é que não pode nem deve continuar sofrendo violência, originada de jovens, cientes de que não serão punidos. O menor pode cometer o crime mais bárbaro possível que receberá como “pena” o cumprimento de medida socioeducativa, mesmo assim por três anos e, quando completar 21 anos, será posto em liberdade com a ficha limpa; se praticar outro crime não será reincidente, mas réu primário.
Os legisladores não devem esperar o cometimento de outros crimes bárbaros pelos menores para fazer tramitar as várias emendas à Constituição, objetivando alteração do art. 228 da Constituição Federal.
Por Antonio Pessoa Cardoso
Fonte: Direito & Justiça
quero ir embora de casa meus pais podem me impedir?
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