domingo, 18 de novembro de 2012

Unir Justiça Federal e do Trabalho pode ser produtivo

Decisão sensata
O Brasil é um Estado Federal e, por isso, possui uma Justiça da União e outra dos estados-membros, estes gozando de autonomia para ter os seus próprios Poderes. A Justiça da União divide-se em Federal, do Trabalho, Eleitoral e Militar Federal. A Justiça dos Estados, espalhada por todo território nacional, é a maior em tamanho e competência.

A Justiça Estadual, onde não houver Vara Federal, processa e julga em primeira instância, as ações de natureza previdenciária propostas contra o INSS e as execuções fiscais e seus embargos, quando propostos pela União ou suas autarquias. Assim é desde a proclamação da República. Os recursos são encaminhados e julgados pelos TRFs.

Esta competência delegada não agrada os Tribunais de Justiça, pois são obrigados a manter um serviço judiciário que é da União. Segundo consta, só na Justiça do Estado de São Paulo tramitam nas pequenas comarcas cerca de 1 milhão e meio de ações da competência da Justiça Federal. Isto representa despesas (espaço, servidores, estrutura) e a União nada paga a tal título. O Tribunal de Justiça de São Paulo cogita de ingressar no Supremo Tribunal Federal pedindo que tais despesas sejam incluídas no orçamento da União (O Estado de S.Paulo, 13.11.2012, A3). É um problema antigo e mal resolvido.

A Fazenda Nacional, com insistência, tem reclamado o fim da competência delegada, por entender que suas execuções fiscais tramitam mais rapidamente na Justiça Federal. Todavia, este anseio exige cautela, pois há estados em que a Justiça Federal está presente apenas na capital e em uma ou duas cidades do interior (p. ex, Amazonas). Por outro lado, não faz sentido instalar Varas Federais em pequenas comarcas, seja porque os gastos são elevados, seja porque não é esta a finalidade da Justiça Federal, que em todos os países que a adotam só existe em capitais e em cidades grandes ou estratégicas (p. ex., Paso de Los Libres, Argentina, divisa com Uruguaiana, RS).

Se a competência delegada é regra de exceção e se essa delegação de competência federal acaba significando um enriquecimento sem causa em benefício da União e prejuízo dos estados, que fazer? Obviamente, não existe uma solução perfeita e nenhuma mudança será fácil. Mas uma hipótese a merecer estudos é a da união das Justiças Federal e do Trabalho.

Ambas têm origem muito distinta. A Federal foi criada em 1890, logo após a proclamação da República, extinta pelo Estado Novo em 1937 e revigorada em 1967. O embrião da Justiça do Trabalho foi o Decreto 22.132, de 1932, através do qual as Juntas julgavam conflitos individuais, cuja execução deveria ser feita na Justiça Estadual. Em 1939, o Decreto 1.237 regulamentou-a como Justiça e em 1943 a CLT definiu seus poderes e atribuições.

A Constituição Federal de 1988 fortaleceu ambas. A Federal desmembrou-se em cinco TRFs e interiorizou-se. A do Trabalho, cuja competência foi alargada pela Emenda Constitucional 45/2004 (v.g., HC contra atos de sua competência e executar de ofício as dívidas de contribuições sociais), espalhou-se por boa parte do território nacional, estando seus 24 TRTs praticamente em todos os estados e suas varas em muitas cidades interioranas.

A Justiça Federal cresceu só na primeira instância, os TRFs continuam sendo apenas cinco. A estrutura de ambas é semelhante, seus magistrados recebem os mesmos subsídios, utilizam-se do processo eletrônico e os cargos dos servidores são os mesmos. Só que, apesar do cofre ser o mesmo elas são duas. Uma (Federal), abarrotada de processos e a outra, (Trabalhista) com números bem mais próximos do ideal.

O relatório de 2011 do “Justiça em Números” do CNJ, registra: Na Federal os magistrados são 1.737 e os servidores 36.468, importando em um percentual de 0,9 e 19 por cada 100.000 habitantes. Na do Trabalho são 3.189 magistrados e 49.397 servidores, sendo 1,7 e 26, respectivamente, o índice por cada 100.000 habitantes. Em número de processos distribuídos em 2011, o TRF da 2ª Região (RJ), que foi o de menor movimento, recebeu 333.689 processos. Já o TRT da 20ª Região (AC), também o de menor movimento na área trabalhista, recebeu apenas 24.183. A taxa de congestionamento nos TRFs é de 70,6% e nos TRTs 45,7%. No âmbito de gastos, para ficar só nos contratos de Informática, os cinco TRFs gastaram R$ 61.834.849 contra R$ 41.016.151 dos 24 TRTs.

Fácil é ver que os números são discrepantes. Os TRFs são poucos, os TRTs muitos, há mais magistrados e servidores trabalhistas que federais, não apenas em números absolutos mas também na divisão por habitantes, e gasta-se mais com informática na primeira que na segunda Justiça.

Se ambas são da União, porque não uni-las?

No mundo corporativo as fusões reduzem despesas, aumentam os lucros, ajudam na competitividade. São dezenas os exemplos. A união da TAM (brasileira) e da LAM (chilena), por certo cria uma companhia de aviação sul-americana em condições de concorrer com qualquer uma dos países mais desenvolvidos. Bancos maiores absorvem os menores. Marcas de roupas de nível internacional dividem os espaços nos centros de compras dos aeroportos. Até clubes se unem para sobreviver.

Imagine-se as duas grandes Justiças da União juntas. Teríamos tribunais de segunda instância praticamente em todos estados, mais ágeis no julgamento (alguns maiores, atendendo a ideia justa de aumento dos TRFs). Os concursos de ingresso seriam em menor número para as mesmas vagas, com grande economia (um concurso para juiz substituto pode sair em torno de R$ 700.000,00). A Justiça da União estaria em um enorme número de cidades, diminuindo drasticamente a competência delegada aos estados. Turmas ou Varas continuariam especializadas, permitindo aos juízes permanecer na área de seu interesse. Mas, os cansados da mesma matéria poderiam com o tempo remover-se e dedicar-se a outros temas. Os órgãos de cúpula (v.g., Conselho da Justiça Federal), as Escolas da Magistratura e as associações, passariam por uma adaptação difícil, mas sairiam fortalecidos. A terceira instância poderia converter-se em STJ para a Justiça Estadual e TSF (ou STU) para a Justiça Federal, unindo no novo tribunal os ministros do TST e os oriundos da Justiça Federal no STJ.

Seria fácil? Não, com certeza. Exigiria reforma constitucional, lei complementando-a, muita boa vontade e dedicação na fase de união. Nas disposições transitórias, um artigo poderia determinar que, durante três anos, as promoções obedecessem a lista de antiguidade antiga, evitando que os mais antigos fossem prejudicados.

Em suma, é difícil, mas não impossível. A experiência da união dos Tribunais de Alçada com os TJs teria que ser aproveitada e o CNJ teria que ser o condutor do processo. Aprofundar-se no tema, mesmo que seja para concluir que não vale a pena, seria oportuno. E com um lema a constar de todos os registros: o interesse público prevalece sobre os interesses individuais.

Por Vladmir Passos de Freitas
Fonte: ConJur

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