
Há que se fazer uma ressalva quando se analisa o problema da falta de condições de trabalho na Justiça. O material humano — magistrados e demais funcionários do Judiciário — é feito da mesma matéria prima dos demais cidadãos: em sua vasta maioria composta por gente séria, abnegada, que não desiste e que, por livre e espontânea vontade, decidiu servir à coletividade ingressando no serviço público. O sucateamento da infraestrutura da Justiça começa na ponta dos dedos desses cidadãos, em suas ferramentas de trabalho. Canetas, lápis, máquinas de escrever — que meu neto acha que é um computador com impressora acoplada — e pilhas e mais pilhas de papéis povoam o cotidiano desses brasileiros que atendem outros cidadãos como eles, ansiosos por verem suas justas demandas resolvidas. Cidadãos esses que convivem em seu cotidiano com todas as mais modernas ferramentas de tecnologia e gestão, agilizando suas vidas particulares e seus negócios, posicionando suas vidas na era moderna.
Atualmente, cerca de 2 mil juízes atuam nos tribunais de primeira instância, distribuídos em todo o estado de São Paulo. Eles constituem a face mais próxima que o cidadão tem da Justiça, pois são os magistrados de primeiro grau os primeiros a examinarem as demandas. Nas mãos de cada um desses magistrados há atualmente algo em torno de 9.802 processos, e é justamente na proporção desses números que reside uma parte dos problemas. Cada caso exige uma atenção mínima de duas horas e meia para ser bem examinado, porque ninguém quer que seu pleito seja visto em ritmo de fast food. Toda causa tem no mínimo duas pessoas envolvidas, além dos respectivos advogados autores das peças jurídicas incorporadas ao processo, e em respeito a elas o magistrado se debruça concentrado para conhecer os autos, que embasarão sua tomada de decisão.
Pois bem, voltando aos números podemos imaginar que os juízes de primeira instância gastariam algo como 24.505 horas ou 3.063 dias corridos, sem interrupção para finais de semana, Natal, Páscoa e os demais feriados, para dar conta do número de processos que hoje eles têm em mãos. Com oito horas de trabalho ininterruptas, sete dias por semana, ao final de 8 anos, a pilha de 9.802 processos estaria despachada. E sem esquecer uma providência importante: sem receber mais nenhum novo processo. Como isso não é possível, chega-se ao óbvio: a atual infraestrutura do Judiciário não permite que a conta feche.
Quantificar o custo dos investimentos é importante em qualquer organização e se torna ainda mais obrigatório quando é feito com dinheiro público. Todavia, a sabedoria popular aponta um tipo de economia muito prejudicial ao poupador: a economia de palito. Não gastar não é sinônimo de poupar ou mesmo de investir com inteligência. Mas aplicar recursos do cidadão em favor dele próprio é lição de boa gestão do dinheiro público, que merece ser repetida inúmeras vezes como exemplo. Formas de controlar o destino das verbas existem, sendo uma das mais simples é garantir a destinação pura e simples do dinheiro através de um recurso que a gíria político-administrativa chama de “carimbar a verba”, tornando seu uso obrigatório para a modernização da infraestrutura.
Por Roque Mesquita
Fonte: ConJur
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